terça-feira, 19 de maio de 2009

O Jogo das Escondidas no Futebol

Todos temos a concreta e optimista certeza de que o nosso futebol, ou como alguns muito empenhados preferem chamar, a nossa indústria do futebol, está no melhor dos mundos. Portanto, é deixar que tudo caminhe sobre rodas como até aqui que nada de mal virá a tal mundo.

Isso dos salários em atraso, das largamente endividadas SAD dos maiores clubes nacionais, da imensidão de jogadores estrangeiros nas competições profissionais, da enorme falta de assistência aos jogos, da quebra acentuada das receitas dos clubes, da entrega dos direitos de transmissão a um monopólio por largos anos, da desvirtuação competitiva por falta de assunção de compromissos remuneratórios aos jogadores inscritos, da virtualidade dos orçamentos para competição, tudo isto são coisas de somenos, pormenores que não podem iludir o grande protagonismo nacional da nossa indústria futebolística.

E onde está, ou por onde vai andando, o Governo? Ao que se vai sabendo, nos corredores a falar à boca pequena com a, b e c. Não quer intrometer prego e estopa tutelar e reguladora. Aqui neste domínio senhorial está praticamente como Pilatos, tira as mãos do fogo, também e quase certamente para não perder votos nas eleições que já se avizinham.

É bem mais fácil ao Governo, ao Secretário de Estado do Desporto, aparecer a apadrinhar candidaturas a grandes eventos de futebol, a distribuir loas e prémios desportivos, do que aparecer e dar a cara por soluções que garantam o futuro da tal indústria e a lealdade competitiva entre clubes desportivos profissionais. Por isso mesmo, porque não quer estar do lado da procura activa de soluções, de definir estratégias de sustentabilidade dos clubes e do futebol profissional, o Governo, melhor o prestimoso Secretário de Estado, prefere estar de lado, indiferente a qualquer das coligações de interesses que se preparam para deixar tudo praticamente intocável.

Porque não se iluda a populaça – sindicato e jogadores incluídos – com a falsa ideia de que os clubes na sua Liga Profissional aceitarão regulamentar em seu desfavor. Lembre-se que quem decide são os dirigentes desses mesmos clubes e as suas decisões não vão certamente contra as suas práticas e interesses, responsabilizando-os por o que até aqui foram irresponsabilizados.

Claro que o Governo, o Secretário de Estado, também estará longe de querer como diz “meter a foice em seara alheia”. E entretanto vai continuando a inaugurar campos relvados, centros de alto rendimento e outros que haja por similares…! E se ao menos fosse ver das novas que vêm do trabalhismo inglês onde o Governo governa mesmo no desporto profissional de futebol e está na primeira linha das soluções inovadoras para um desporto que naquele país é, aí sim indiscutivelmente, uma enormidade competitiva e industrial..!

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Portugal numa encruzilhada histórica – 2009 e depois?

Portugal está hoje em 2009, no final da primeira década deste século, numa encruzilhada histórica, acumulando um decénio de empobrecimento e estagnação económicos, fruto de uma crise estrutural profunda a que se adicionou recentemente esta gravíssima crise financeira e económica mundial.

Aquilo que se prevê para depois de Outubro de 2009, data das eleições legislativas, é uma situação de desemprego maciço próximo dos dez por cento, uma enorme dívida pública de bastante mais de setenta por cento do PIB, um endividamento externo de mais de cem por cento do PIB e que se traduz numa perda de riqueza para o exterior de dez por cento do PIB ao ano, um défice orçamental bem acima dos seis por cento do PIB, uma falta de competitividade económica internacional que tem tradução em baixíssimos níveis de produtividade média das nossas empresas e numa enorme falta de qualificação média dos nossos trabalhadores.

Tudo numa economia em perda forte de riqueza gerada, qualquer coisa como menos quatro por cento em 2009, e com uma pequeníssima capacidade potencial de crescimento, já de apenas um por cento ou mesmo menos, e que só retomará o crescimento algures lá para 2011 ou 2012.

A situação económica, financeira e social em Portugal está, assim com todos estes factores que são estruturais, enormemente degradada e é já hoje potencialmente explosiva.

A uma economia sem capacidade de gerar crescimento económico e aumento da riqueza nacional adiciona-se agora um desemprego maciço que atinge vários sectores económicos tradicionais com empresas vulneráveis de pequena e média dimensão que empregam sobretudo trabalhadores com poucas qualificações, muitos deles de média idade e com muitos anos de actividade numa única empresa, os quais terão dificuldades acrescidas de regressarem rapidamente ao mercado de trabalho. Muitas destas empresas que vão fechando, e são centenas, situam-se em zonas interiores do território nacional e são por vezes os únicos empregadores possíveis para muitos daqueles trabalhadores nas respectivas localizações.

Perdem-se muitos e muitos empregos, desaparecem pequenas e médias empresas e com elas capacidades produtivas que dificilmente se recuperarão. E tudo isto se vai passando em zonas do país onde praticamente em muitos casos não existirão no futuro próximo outras oportunidades de emprego produtivo para esses trabalhadores agora desempregados. Vai ficar um imenso rasto de empobrecimento nessas zonas e inúmeras vidas pessoais e familiares entrarão em ruptura.

Acresce que nestes casos o Estado pouco pode fazer para modificar a situação a não ser a atribuição dos correspondentes subsídios de desemprego pelo respectivo período de duração. Depois disso o Estado desaparece da vida dessas pessoas e famílias e deixa de contar para os seus projectos de subsistência digna. Falar-se, por isso, como se vai ouvindo em certos sectores políticos nacionais, de que o Estado tem de estar na linha da frente, que é a solução para todas estas situações de imensa dificuldade e de perda de sustentação pessoal e familiar, é um equívoco ou mesmo um embuste.

A solução e as hipóteses de modificar essas desgraças individuais e familiares só podem vir da criação de empresas, do aparecimento de novos empresários e de novos negócios, das capacidades empreendedoras de alguns portugueses. E essas iniciativas empresariais devem ser por isso enormemente acarinhadas e estimuladas por todos, a começar pelas autoridades públicas centrais e locais. Os recursos financeiros disponíveis devem ser canalizados para estas regiões que perdem emprego e favorecerem-se as condições de aparecimento de novas empresas e negócios, quaisquer que sejam as suas dimensões. Todo o novo emprego vai ser necessário e o microcrédito para pequenos projectos de vida pessoal e familiar deve estar disponível em todo o lado onde ele possa amenizar as dificuldades de emprego.

A agricultura e a indústria devem ser sectores prioritários, porque Portugal tem de voltar a produzir bens com valor acrescentado nacional significativo e passíveis de serem transaccionados não apenas no mercado interno mas também exportáveis. Os projectos que tenham orientação e vocação exportadora devem ter primazia e serem especialmente apoiados e acarinhados.

Só a economia a funcionar pode resolver a falta de emprego e de projectos empresariais viáveis, o Estado nunca será a solução para a ausência de empresas que criam empregos. Por isso, o Estado deve fazer tudo para criar as condições de emergência de novas empresas e projectos, colocando toda a administração central e local ao serviço das empresas.

O Estado tem de passar a ser um facilitador da iniciativa empresarial actuando com a mesma rapidez e vontade com que actuam os empreendedores. À iniciativa empresarial tem de corresponder uma não menor motivação e celeridade das autoridades públicas que têm de intervir no processo de licenciamento e funcionamento das novas empresas. Os prazos de resolução e de decisão dessas autoridades têm de ser escrupulosamente respeitados e pode e deve haver casos em que o deferimento seja automático ou tácito se esses mesmos prazos forem ultrapassados.

E em muitas situações o Estado pesado e lento por tradição deve mesmo eximir-se de intervir quando dessa sua intervenção puder resultar dificuldade para a efectiva criação de novas empresas ou para o lançamento de novas iniciativas empresariais.

O Estado tem de estar ao serviço dos cidadãos desempregados e os denominados interesses públicos devem ser aqueles que são compatíveis com a promoção do emprego e das novas actividades económicas. Os interesses públicos não podem ser os dos funcionários da administração, dos serviços do Estado em si-mesmos, só podem ser aqueles que estejam a favorecer os cidadãos, sobretudo aqueles que criam empresas e os que procuram retomar ou obter emprego.

Portugal vai precisar de muitas centenas de novas empresas e de muitas outras centenas de iniciativas e projectos empresariais criadores de riqueza e geradores de empregos, se possível com maior nível de formação e qualificação, e assim tem de mobilizar os seus recursos financeiros públicos e privados para estes novos projectos. Porque são estes que poderão fazer crescer economicamente o país e melhorar o nível de vida dos portugueses.

E a partir de Outubro de 2009 são estas algumas das opções estratégicas que estarão no caminho de Portugal. De outras dessas opções falaremos em novas oportunidades.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

quinta-feira, 7 de maio de 2009

10 Anos de Crise em Portugal

Portugal vai ter praticamente 10 anos ininterruptos de crise. Chegaremos muito provavelmente ao ano de 2010 com os mesmos níveis de riqueza que tínhamos lá para o ano de 2004 quando o então Primeiro Ministro Durão Barroso anunciou o “Portugal de tanga”.

Até 2004 tinha havido uma espécie de bebedeira colectiva no consulado do anterior governo socialista de António Guterres (que vinha de 1996), possível pela criação das condições da nossa adesão ao Euro que reduzira enormemente a inflação e o custo do crédito, e também pelos muitos milhões de contos que diariamente chegavam de Bruxelas (só estes representavam quase 2% do nosso PIB anual). E os portugueses tinham entrado alegremente no que consideravam uma época dourada, enriquecidos portanto, sem que tivessem feito os investimentos e os negócios na sua economia que motivassem essa nova condição de vida. Riqueza, dinheiro, bens, artificialmente criados e mantidos, por conseguinte.

Desde aí, desde “a fuga ao pântano” do Primeiro Ministro Guterres, estiveram ao leme três governos. Respectivamente o de Durão Barroso que abandonou o “barco” ao fim de apenas dois anos para ir presidir em Bruxelas à Comissão Europeia, o de Santana Lopes rapidamente despedido pelo então Presidente da República Jorge Sampaio e o actual socialista, de novo, chefiado pelo Engenheiro José Sócrates e que já leva quase quatro anos de mandato. Portanto, Portugal nos últimos doze anos foi em cerca de dez governado pelo partido socialista.

Depois de findada a grande ilusão da governação de Guterres, Portugal desde o ano de 2004, já no mandato do actual Governo, endividou-se numa conta esmagadora que praticamente corresponde a 100% do seu PIB, e todos os anos saem do país mais 10% da sua riqueza criada, porque o que todos o país gasta é nessa conta superior ao que produz. A riqueza nacional esvai-se, dessa forma, para além fronteiras, numa cadência imparável que só pode ter como principal consequência o empobrecimento cada vez maior dos portugueses. Haverá certamente um momento, já muito próximo no tempo, em que os bens nacionais começarão a ser vendidos ao estrangeiro e a preços nada recomendáveis.

Os impostos nos últimos quatro anos cresceram flagrantemente para darem cobro ao enorme défice do Estado que andou sempre muito acima dos comportáveis 3%. E o mesmo Estado já hoje gasta cerca de metade da riqueza criada pelo país. Num país que não cresceu economicamente nestes anos o seu Estado tem-se vindo a apropriar ano a ano de uma parcela cada vez maior da riqueza criada, portanto. Um peso já agora esmagador e que reduz a margem de liberdade da sociedade civil, nela incluída a dos indivíduos e das empresas necessariamente.

A quebra desse défice orçamental para os apenas 2.6% do PIB em 2008 foi conseguida com um enorme aumento da nossa carga fiscal nos últimos três anos deste actual Governo, o que nos aproxima dos níveis mais elevados de carga fiscal da União Europeia, ainda que tenhamos, objectivamente, dos mais baixos níveis de rendimento médio por habitante e portanto as pessoas fiquem mais aprisionadas pelo Estado com esses mesmos níveis de impostos.

Por outro lado, a dívida externa da República (a conhecida dívida pública) cresceu vertiginosamente nos últimos três anos, e anda já hoje também próximo dos setenta por cento do PIB, representando aquilo que é transferido de encargos acumulados pelo nosso Estado para as próximas gerações. Só os juros dessa dívida pagos anualmente já se aproximam do valor do investimento público anual (os cerca de 3% do PIB).

Desde 2004 até hoje, e uma vez que já está anunciada uma queda de 3.5 % do PIB em 2009, a riqueza do país é praticamente a mesma. Portanto, em média e com os efeitos da inflação descontados, os portugueses, cada português de Portugal, tem menos rendimento real anual à sua disposição em 2009 do que aquele que terá tido em 2004. E quando não se cria riqueza, mesmo que se redistribua alguma, os habitantes não podem ficar melhor. Na União Europeia, Portugal nesta década foi o país que mais perdeu relativamente aos níveis médios de crescimento da riqueza.

O país tem assim empobrecido sistematicamente ao longo de toda a primeira década deste século XXI. Em crescendo está como não podia deixar de ser a pobreza aliada a uma grande desigualdade social e económica, que é das maiores na Europa onde estamos integrados, e tem tradução nos cerca de 2 milhões de portugueses pobres. A que se associam muitas centenas de milhar de outros com pensões e reformas que os colocam praticamente nos mesmos níveis de pobreza relativa ou em limiares de grandes carências de alimentação, cuidados de saúde e dignidade humana.

Tudo isto no Portugal que recebeu e continua a receber muitos milhares de milhões de euros que têm vindo dessa mesma Europa desde que nela nos integrámos em 1986.

Por outro lado, a cadência de investimentos estrangeiros significativos diminuiu acentuadamente ao longo de toda esta década, quer por questões de periferia do país relativamente ao centro europeu que se deslocou progressivamente para leste, quer porque há inúmeros factores que tornam Portugal muitíssimo desinteressante para os grandes negócios internacionais. E à cabeça destes factores negativos estão a completa ineficácia da justiça, o baixo nível de qualificações da maioria dos trabalhadores portugueses, a falta de competitividade do contexto nacional para os negócios internacionais (os agora denominados “custos de contexto”).

O papel do Estado na sociedade portuguesa é um destes mais poderosos factores desincentivadores do investimento produtivo, quer porque está presente em demasia, directa e indirectamente, nas actividades económicas, e em alguns sectores mesmo em concorrência com as empresas privadas, quer porque a sua actuação através da administração pública que dirige é muitas vezes pouco transparente, demorada e geradora de favorecimentos e corrupções várias. O Estado português é grande demais e muito ineficiente e ineficaz e nem no seu papel importantíssimo de regulador ele se pode considerar modelar, disso se queixando muitíssimas empresas sujeitas a esses maus poderes regulatórios do Estado.

Ao mesmo tempo, o país tem assistido também a perdas acentuadas de capacidades produtivas no sector agrícola e mesmo em subsectores industriais, nestes últimos em segmentos de baixa qualificação e com baixos factores de diferenciação produtiva e níveis de produtividade e organização empresarial débeis. O país tem exageradamente escolhido um modelo económico que privilegia os serviços, abandonando a agricultura e a indústria. E estas escolhas têm óbvias consequências na produtividade, competitividade, criação de riqueza e captação de mercados e investimentos internacionais. Investiram-se grande parte dos recursos disponíveis e obtidos externamente em sectores de bens que não podem ser trocados e vendidos nos mercados internacionais, o que impede o país de obter receitas de exportações que possam diminuir as cadências de saída de riqueza para o exterior todos os anos.

Portugal está hoje em 2009, no final da primeira década deste século, numa encruzilhada histórica, acumulando um decénio de empobrecimento e estagnação económicos. O país é vítima de uma crise interna estrutural com inúmeros factores específicos e que perduram e de uma crise internacional gravíssima que, entretanto, se veio adicionar ao triste panorama próprio.

Mas a crise externa não pode fazer esquecer, nem elimina todos os factores da crise estrutural portuguesa que caracterizam a nossa economia e situação financeira e que certamente perdurarão se não forem eficazmente combatidos. E esse combate efectivo é o que se verá se vai acontecer nos próximos anos quaisquer que sejam os governantes – tal só se fará se existir um projecto nacional e uma consequente estratégia de crescimento económico e de diminuição do endividamento externo.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto