quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Uma Cena da Realidade Portuguesa (Mal Vamos…!)


Hoje de manhã cheguei ainda bastante cedo ao trabalho, já depois de ter atravessado a por estes últimos dias praticamente esvaziada de carros “Ponte sobre o Tejo”. À hora a que cheguei ainda só os senhores da segurança e mais um ou outro dos meus colegas teriam também já chegado.

Trabalhei depois durante praticamente toda a manhã, até cerca das treze horas, no meu gabinete de trabalho, sentado à secretária, com computador e com o ar condicionado e as luzes de tecto acesas.

Saí para ir almoçar como habitualmente para a minha tasquinha de serviço a cerca de cinco minutos de caminhada a pé. Almocei rapidamente também.

No meio do repasto um dos habituais comensais lia o Jornal “A Bola” e exclamava: a indemnização vitalícia definida em tribunal à família do vitimado jogador húngaro de futebol do Benfica Féher podia tramar muitos patrões portugueses.

Dizia o comensal ao sócio da casa com quem falava que aquilo que tinha acontecido ao jogador não era um acidente em trabalho, porque ele não tinha caído de um andaime, não tinha levado com uma ferramenta na cabeça, não tinha caído num buraco, não tinha sido vitimado pelo trabalho mas antes pela falência do seu órgão cardíaco. E adiantava mais: que se esta decisão pegasse qualquer trabalhador que morresse com idêntica lesão podia levar o seu pequeno patrão até à falência.

Acabei o meu almoço e vim rua fora de volta até ao meu local de trabalho. Que é, lembre-se, o tal gabinete com secretária, computador, ar condicionado e luz de tecto.

Mas antes de entrar o meu portão eis que me dou com um trabalhador de obras de rua. O homem de meia-idade, mais de cinquenta anos certamente, estava a trucidar alcatrão com um martelo pneumático barulhento e avassaladoramente trepidante. O corpo do operário tremia como varas, e ele fazia imensa força física para que o aguçado cabo afiado se enterrasse alcatrão dentro.

Eis senão que do outro lado da rua um polícia se abeira do operário e lhe pergunta, uns poucos instantes depois de perceber o cenário do trabalho em que ele se movia, porque ele não usava os auscultadores que estavam dependurados numa cerca metálica envolvente da obra.

E responde-lhe prontamente o afanado trabalhador com uma acentuação linguística própria de um qualquer país de leste europeu: se for assim não consigo ouvir o martelo a chegar ao fundo e trabalhar tão rápido e eficazmente!

Do outro lado dessa mesma rua, olhei e vi um português bem vestido, trinta e tantos anos, todo vertical, com um gorro enfiado na cabeça e luvas de mão. Este estava ali mas não naquela tal obra. Estava isso sim era a arrumar carros em cima dos passeios bem ao lado do tal agente da autoridade.

Entrei o meu portão e fui sentar-me ao meu computador de secretária, com as luzes do tecto acesas, mas com o ar condicionado agora desligado porque estava quente suficientemente o ambiente, e vai de dedilhar esta historieta da nossa crua realidade nacional.

Acho que tudo isto diz imenso, é um quadro grotesco e tristemente realista da nossa situação de crise gravíssima, e diz uma enormidade sobre a nossa trágica situação económica, financeira, ética e moral.

O trabalho, como se ouve à noite na televisão quando estou de regresso ao meu lar, tem de ser digno, com direitos e bem pago. Tudo isto parece certo, muito certo mesmo. Mas não é que ainda há quinze dias o Jornal “Expresso” também dizia que há empresas industriais do norte de Portugal à procura de empregados/trabalhadores em áreas geográficas cheias de desempregados e que não conseguem encontrar candidatos.

Não sei se aquele operário estrangeiro da frente do meu portão ganharia muito mais que o famosíssimo salário mínimo. O que concluí desta cena da realidade viva deste Natal de 2010 é que aquele operário estava a trabalhar duramente e que a sua dignidade excessiva até lhe impunha que se martirizasse mais do que seria necessário em nome da sua ética pessoal de trabalhar rápida e eficazmente.

Logo à noite quando me voltar a sentar em frente da televisão a ver os Telejornais diários vou retornar provavelmente a ouvir um qualquer dirigente sindical dos catedráticos do regime a zurzirem contra os patrões e o Governo por termos tantos desempregados e tão baixos salários. É ponto assente que essa narrativa reaparecerá algures numa qualquer notícia do dia nesse meu serão, depois de mais um dia em que Portugal se endividou outros vários milhões de euros aos prestamistas externos.

E agora que acabo este escrito ainda continuo a ouvir lá fora ao relento e sem tampões nos ouvidos o tal operário cinquentão a martelar o alcatrão, tremendo vigorosamente por todo seu corpo pela força imensa do pneumático. Ah! o arrumador protegido de barrete e luvas lá continua, agora uma centena de metros mais abaixo, a ganhar a moeda de cada dia um pouco mais distanciado do polícia que continua impávido e sereno no mesmo lado da rua: o lado contrário do tal operário (que da maneira como eu me situo na cena é o meu lado esquerdo, vulgarmente conhecido também como o do coração e o do trabalhadores de condição moral inequívoca e de esforço árduo).

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 28 de dezembro de 2010



A vida tem um sentido superior que agora vamos celebrar. Nesta época natalícia lembremos os valores superiores que essa nossa vida tem de expressar. Podemos estar próximo do Senhor desta bandeira que aqui ressuscitava. Podemos segui-lo ou acompanhá-lo, mas nunca poderemos estar indiferentes ou adormecidos para a sua grandeza e mensagem inolvidável. Festejemos pois esta nossa caminhada junto de todos quantos nos querem bem e de todos os outros que merecem a nossa carinhosa simpatia.

Feliz Natal e Bom Ano Novo!

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

PORTUGALMENTE: Mais Primeiros de Janeiro para Portugal Futuro!


Texto publicado na edição comemorativa do aniversário do Jornal "O Primeiro de Janeiro", em 1 de Dezembro de 2010.
“I. “Um estado de espírito”
Portugal, o “PORTUGALMENTE” que aqui nos convoca, sempre mesmamente determinado nas suas raízes e conquistas, fundado no seu pretérito consistentemente prolongado no seu futuro. Um país de ontem e de hoje, mesmamente. Sempre em redor da sua pequenez, do seu miserabilismo e da incapacidade e corruptibilidade fácil e tacanha das suas elites. Um país de Eça, decadentista com Pessoa, onde campeavam e agora se perpetuam as suas e mesmamente abomináveis e características personagens, e onde se diz, à falta de mais e melhor, que a Igreja obscurecia e continua obscurecendo as mentes eternamente.

Um país com medo de si-próprio, sem ensino sério e amplo, sem indústria capaz e sem governos com projecto.

Foi assim também no início do século vinte e deu, primeiro em bandalheira, e depois, consequentemente, em ditadura salvífica e absurdamente castradora.

Sempre o mesmo terreno da ignorância, vergonha, medo, secretismo, inveja, e muita, muita cobardia intelectual das pequenas elites estrangeiradas e esmagadoramente francófonas. Ou também, por vezes e ocasiões, anglofonamente subjugadas.

O mesmo país de hoje, ainda, onde a economia é incapaz, fora de tempo, onde as Universidades existem em si, para si, e governadas corporativamente. Um cantinho pretensamente europeu e moderno em que as luminárias políticas mentem descaradamente, onde o povo se diverte com telenovelas diárias, a justiça é folclore e inexiste, e o ensino é um embuste geracional de quem o comanda para quem o recebe.

Sobram as obras de regime, pretensamente o tutano governativo, discutidas no mesmo país que fecha tudo para os que pouco tinham, e abre auto-estradas para os caixeiros e para os cruzados do imobiliário.

Um país com uma “capital” a cair de podre e de dívidas, campeã da incúria e do desmazelo, onde se tropeça em cada buraco, se vive ao abandono e se a despovoa.

Um “Portugal com medo de existir”, triste e abandonado, sem alma e sem vontade de si.
E cada vez mais encruzilhado numa Europa que não se sabe bem o que é, o que vai ser, e para onde vai…!

II. “Uma Cultura de Menos”
A obra de David Landes “ A Riqueza e a Pobreza das Nações” (do domínio da história económica), pode fundamentar o reconhecimento e alargar o espaço de discussão do nosso retardamento económico e cultural. A este respeito uma grande parte da obra daquele professor de Harvard é dedicada a explicar o atraso da outrora poderosa China (um potentado ímpar até aos séculos das descobertas ocidentais) que teria adormecido durante séculos num contexto marcadamente cultural e pouco presenciado pela influência da religião segundo aquele autor.

Lembre-se também a este respeito que existem historiadores portugueses como o professor Hermano Saraiva (vide “História Concisa de Portugal”, Publicações Europa América) que radicam a nossa decadência logo depois das descobertas e “do reino despovoado e gasto pelo dinheiro da canela” (cantado poeticamente como recordamos).

Também seria útil tentar uma compreensão lata e não meramente eclesial do nosso atraso elucidando-a com a obra de Tocqueville ("A Democracia na América", Edições Principia) que se surpreendeu com o que naquele “Novo Mundo” foi encontrar, a de Max Weber que destrinça categoricamente a valia da ética protestante na criação do espírito capitalista, ou as mais recentes de Fukuyama (Confiança: Valores Sociais e Criação de Prosperidade, Gradiva) que exalta as diferentes culturas e respectivos valores sociais na criação das condições da prosperidade nacional, e a seminal de Michael Porter, também de Harvard, que desenvolve comparativamente os modelos de criação nacional em “A Vantagem Competitiva das Nações”.

Pode então pensar-se a estas luzes mais científicas, embora sociais, e menos enfeudadas tão só em pressupostos ateístas, porque esses também já eram os dos republicanos do início do século vinte, em discutir amplamente como foi possível no passado, é e continuará a ser provavelmente no futuro que estamos a preparar colectivamente (dizemos nós como pessimistas inveterados e adeptos da formulação categórica do "decadentismo pessoano"), que Portugal exiba os patamares económicos, educacionais e culturais que nos apoucam no concerto da Europa, pelo menos.

Porque a 1ª República foi esmagadoramente laica e persecutória da Igreja, e depois de Abril o Estado é laico, o ensino foi sempre durante todo o século vinte esmagadoramente público, e depois de 1974 vincadamente não confessional, mas os valores predominantes que marcam e estruturam a organização social, cultural e económica, ontem sob o Salazarismo e desde da ruptura de há trinta anos, continuam marcadamente antiliberais, pouco ou quase nada capitalistas no sentido de Smith, Hayek ou Friedman, tanto no povo descapitalizado em capital humano como nas ricas elites educadas profissionais, académicas ou empresariais.

Discuta-se sobre as cercanias da liberdade e a exigência devidamente medida e avaliada na educação a todos os níveis, sobre a pontualidade e a produtividade nas empresas e nos serviços públicos, sob a devolução da riqueza à sociedade em verdadeiros exercícios de filantropia e responsabilidade social, sobre a assunção e prémio dos riscos e dos fracassos da iniciativa individual e a aceitação dos erros e insucessos como novas oportunidades de os mesmos que inicialmente fracassaram virem a empreender de novo no futuro, sobre a responsabilidade e a prestação efectiva de contas do Estado e dos seus mais relevantes agentes e actores políticos perante os cidadãos, sobre os níveis de exigência destes sobre os seus representantes eleitos e a responsabilização destes perante os primeiros, sobre a auto-organização da sociedade civil para empreendimentos sociais ou para a criação de espaços de discussão profunda de políticas públicas sectoriais (os conhecidos “think thanks” saxónicos) e o que encontramos neste Portugal?

Discuta-se libertando as energias criadoras e inovadoras mas mude-se e estruture-se a vida económica e cultural (em sentido lato) de acordo com os princípios orientadores dessa análise crítica!

Seria tal empreendimento possível? E a quantos e a quem interessariam estas mudanças culturais?
Por isso, a nós convém-nos que radicar tudo do nosso reconhecido atraso e subdesenvolvimento cultural, social e económico, ou mesmo político, simplesmente nos malefícios históricos centenários da igreja católica é parca explicação intelectual e culturalmente enquadrada para tanta insuficiência de nos governarmos organizada e estrategicamente como nação e como País, quer no passado quer, como fácil e entendidamente se antevê, nos próximos decénios!” (fim de citação).

O texto anterior foi escrito em Outubro de 2007 para iniciar o meu BLOG pessoal, www.portugalestrategico.blogspot.com, é aqui e agora propositadamente retomado pois nele se dá aprofundado testemunho das muitas das nossas fragilidades e actuais angústias como País multissecular que somos.

Portugal tem uma história de feitos e defeitos, de promessas e vitórias, de desventuras e derrotas, de sonhos e devaneios, de aventuras e ensimesmamentos, de grandezas e misérias. Mas tal como teve passado, esta Nação terá futuro e nunca morrerá!

Aos muitos portugueses de hoje e aos que hão-se vir a fundar e refundar esta nossa ditosa Pátria, que foi a de Camões e de Pessoa, Ela há-de continuar a dar frutos e guarida para os seus trabalhos e canseiras, sonhos e devaneios, esperanças e visões.

E que nesta continuada gesta lusitana, “O Primeiro de Janeiro”, em cada primeiro dia de cada ano novo, em cada um dos demais que se lhe sigam em cada um desses muitos anos que marcarão o futuro deste Portugal imorredoiro, esteja aqui, ali e acolá, a prestar o seu preito vocabular e imagético a essa tragédia humana grandiosa e enorme de um Povo que mesmo na sua pequenez sempre será capaz de se mostrar tão ou mais que os melhores!

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Xótraques, Truques e Verborreia


Definir o comportamento absurdo e extravagantemente alucinado de alguém que é indefinível, desnaturado, incompreensível, fluído e volúvel, bêbedo de poder, pantomineiro, desprendido da realidade e da verdade, truculento, arrogante, vaidoso incorrigível, ameninado, vítima fácil, tudo isto ao mesmo tempo numa personalidade, é tarefa completamente votada a fracasso de entendimento definidor. Mas que talvez se possa entender melhor com algumas frases célebres de tradutores vultuosos da coisa política e da encenação cobarde da governação nos regimes democráticos. Ora vejamos:

Maquiavel, na sua obra magna de política, “O Príncipe” de 1532, retrata a facilidade com que os dirigentes políticos menores podem seduzir, enganar, mentir, ludibriar, encurralar, e finalmente empobrecer os povos que governam ao dizer claríssimamente que “os homens são tão simples e tão obedientes às necessidades do momento, que quem engana encontra sempre quem se deixa enganar”, e que também na realidade, “ os homens em geral julgam mais com os olhos do que com as mãos, porque todos podem ver facilmente, mas poucos podem sentir. Todos vêm bem o que pareces, mas poucos têm o sentimento do que és – e estes poucos não ousam contradizer a opinião da maioria que tem do seu lado a majestade do Estado a defendê-los”.

2º Adam Smith, o pai da economia política, filósofo do liberalismo, também dizia na sua obra-prima de 1776, “A Riqueza das Nações”, que: “O orgulhoso ministro de uma faustosa corte pode, muitas vezes, ter o prazer em executar uma obra de pompa e magnificência, como por exemplo uma grande estrada frequentemente apreciada pela alta nobreza e cujo aplauso não só alimenta a sua vaidade como ainda contribui para manter a sua influência na corte. Ma executar muitas obras pequenas, nas quais nada do que se faz salta aos olhos, nem provoca a mínima admiração de qualquer viajante e que, em resumo, nada possuem de especial que as recomende, a não ser a sua extrema utilidade, é algo que surge como demasiado mesquinho e insignificante para merecer a atenção de um magistrado superior. Por consequência, numa administração deste género, estas obras são quase sempre totalmente descuradas”.

Arnaud Mayeur, na sequência de uma análise profunda aos denominados ciclos político-económicos das democracias em que os dirigentes manipulam grosso modo as políticas para obterem resultados eleitorais vantajosos, dizia que “à semelhança do que dizia Winston Churchill [um dos grandes líderes políticos do século vinte], a democracia é, ao mesmo tempo, o melhor e o pior dos sistemas: o melhor porque só o povo é soberano nas suas escolhas e julga as acções desenvolvidas; o pior porque pode ser dominado, desviado, modificado, por políticas e por políticos embriagados com o poder…”.

Palavras, mais palavras, para quê? É um artista, um grande artista, português! Ele é “Xótraques, Truques e Verborreia”, tudo em muito, infelizmente para os tristes portugueses pagadores de impostos e da dívida soberana por várias décadas que aí vêm vindo! E em cada uma daquelas citações acima podem encontrar-se esclarecidas as formas de pensar, agir e governar da dita criatura que conduziu Portugal ao abismo. E que vai levar portugueses de todas as idades a pagar com empobrecimento a loucura despudorada de governar em que a personagem indefinível se embebedou de poder!

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A Tragédia Anunciada e Portugal!

Afinal as contas do orçamento servem para quê? Ninguém agora parece estar a apresentar soluções para a tragédia que estava anunciada. E quem vai estar ao leme para todos os anos que aí vêm e que implicam grandes sacrifícios? Já não há disposição para ouvir os governantes que aqui nos conduziram! E não podem ser os mesmos actores políticos, medíocres e mentirosos, que definam as condições e as estratégias que possam salvar Portugal. Têm de vir para ribalta política e partidária pessoas com passado profissional e vida reconhecida como incólume do ponto de vista ético e do rigor para que os portugueses possam confiar os seus destinos e os dos seus filhos nas suas escolhas, decisões e acções. Está em causa o futuro independente e digno de Portugal, como Nação milenar e Pátria dos portugueses de todas as gerações.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Sócrates: de Tio Patinhas a Xerife do Inferno!


Sócrates, o nosso Engenheiro das promessas imensas e eternas, do Estado social total, da economia vibrante das décimas e centésimas, da distribuição impagável de Magalhães pelas criancinhas, das grandes e incomensuráveis obras de regime, o homem que tudo fingiu que deu e prometeu aos portugueses, muitas vezes em dobro e triplo, trouxe Portugal até às portas da falência do Estado e do próprio regime.

Sócrates foi neste seu longo consulado o Tio Patinhas, que parecia estar sempre inundado em tanques cheios de dinheiro e podia dar tudo a todos ou fazer tudo quanto quisesse. Nada estava fora do seu alcance e do património que dizia gerir em nome dos portugueses. E se não tinha inventava, mudava de tons a realidade, emendava a mão, torcia números e estatísticas, fazia anúncios de vendedor de ilusões, propagandeava e inventava novas obras de engenharia ou reengenharia financeira pagável bem lá mais para a frente nas próximas décadas e gerações. O homem exauria-se em tantas e tamanhas façanhas majestosas, qual “Rei Sol” desta terceira República socialista e laica para quem o Estado era ele, somente ele e as suas imagens espelhadas de um magnânimo redentor e moderníssimo dinamizador.

Décadas lá bem à frente chegariam as contas de tanta Engenharia e Reengenharia Socrática, o que convinha a tanta dinâmica, tanta vontade de “fazer fazer”, tanta energia inesgotável e tanto voluntarismo obstinado. Do homem que só quer fazer e fazer o que nunca foi feito, mas que não estará lá quando chegarem as facturas imensas de tanta obstinação e “volúpia obreirista”, todos temos agora a nefasta historieta às nossas portas e bolsos.

Só que agora o mesmo Sócrates, o tal indómito corajoso do “faça agora e pague depois, bem depois mesmo”, veio anunciar que o Mundo vai cair em cima de Portugal e dos portugueses que ele governa há seis longos anos se não se refizer a tal história voluntariosa que ele vinha vendendo e se apertarem duramente os cintos dos portugueses obrigados e agradecidos da obra fantástica do Engenheiro. Agora o momento passou do fantástico ao funesto e ao miserável, de muitas vidas de portugueses concidadãos, porque Sócrates tornou-se num Tio Patinhas entrementes morto ou desaparecido.

E vai daí, num dia destes passados, mais propriamente à hora de jantar, entrando pelas casas dos seus queridos e estimados eleitores e outros mais portugueses, o mesmo Sócrates anunciava que se tornara do anterior Tio Patinhas que tinha sido até aí mas, agora, por imposição externa como ele gosta de novamente repetir, no “Xerife do Inferno em Portugal” de 2010 até sabe-se lá quando.

Do Inferno em que ele vai ter de comandar como seu Xerife, muito semelhante ao de Nottingham que tudo tirava aos necessitados para encher cofres do xerifado, tendo como disse com uma estranhíssima fácies uma grande dor de alma, imagine-se, que era a de ir criar aos portugueses, para salvar não se sabe bem o quê, o tal Inferno dos impostos a eito e dos congelamentos e reduções de rendimentos do trabalho. Que dor que temos que ter todos nós da dor de alma do nosso novo inexcedível “Xerife do Inferno”!

Ele até já deve estar provavelmente convertido e a ir à missa da tarde rezar diariamente em defesa dos portugueses a quem vai tirar o coiro e o cabelo e a preparar-se para ir ao confessionário, a fim de poder expiar esses pecados que lhe invadem a sua alma pura e excelsa, e tomar também uma hóstia sagrada que lhe permita aliviar as penas que carrega. Será que o Engenheiro se converteu neste finalmente da nossa vida que ele nos trouxe e também vai pedir a expiação através do confessionário ao Padre Melícias?

Sócrates era o mesmo de sempre ainda quando há poucos dias lá nas terras do Tio Sam dizia que nem quereria o poder porque ele o queimaria agora, e se pudesse zarpava para algum posto dourado numa qualquer empresa das do seu prestimoso regime de favores ou para um qualquer cargo internacional que o seu Estado pudesse fazer o grato favor de lhe facultar, se o PSD fizesse o favor de lhe reprovar o Orçamento de Estado que ainda nem tinha apresentado ao País.

Sócrates diz também que tudo isto, este infernizar da vida dos portugueses que trabalham e lutam para criar os seus filhos e viverem com dignidade sem qualquer destino radioso visível neste horizonte da pequena engenharia orçamental socialista, é a sua última escolha e que só nos fez estas coisitas porque não tinha alternativa. Mas então que andava ele a fazer ainda há poucas semanas quando displicentemente se alimentava de inaugurações de tudo quanto mexia e se aprestava a debitar optimismo e carradas de anti-depressivos do tipo Prozac sobre Portugal e os portugueses mais crédulos?

Quem via o agora “Xerife do Inferno”, da morte do mundo que vendia e que acaba de anunciar nesta altura sem quaisquer vislumbres de futuro e de visão para Portugal, podia assistir ainda há semanas a uma autêntica “empresa” de venda de banha da cobra em pequenas inaugurações de tudo e mais qualquer obra, numa negação visível daquilo que agora o mesmo “Senhor do Fim dos Tempos” veio anunciar que tem necessariamente de
acontecer desde 2010 em diante e sem termo à vista.

Sócrates conduziu Portugal à falência e ao Inferno, e agora quer, ou finge que quer, ser o Xerife desta catástrofe anunciada. Só que esquece que nestes seis anos gastou os recursos dos contribuintes e os muitos e muitos milhões de endividamento externo em obras que ficam para pagar no futuro, que nestas obras favoreceu com contratos de parcerias os vários amigos empresários e banqueiros do seu regime, que colocou milhares de correligionários e apaniguados socialistas em toda a administração e empresas públicas, e que alimentou a rodos de dinheiro público um autêntico fartote de despesismo no Estado, a começar pela sua mais próxima entourage.

Sócrates viveu numa verdadeira bebedeira de poder, paga a peso de milhares de milhões de euros de dívidas que ficarão para as próximas gerações. E trouxe-nos a todos nós, com a sua irresponsável negação da realidade e a sua estranha e mentirosa irrealidade, até às portas do descalabro e do Inferno.

Vamos ver se ele tem agora a tão apregoada coragem de ser o que anunciou que seria: o Xerife do Inferno! E se morre queimado na própria fogueira que trouxe com a sua irresponsável governação e liderança. Que morra pois nessas chamas e liberte Portugal para outras formas de entender o futuro e a esperança dos portugueses!

Os portugueses e Portugal não vão esquecer como o mesmo homem, fautor de grandes operações teatrais de engenharia eleitoral, com promessas aluadas e alucinadas que nunca cumpriu, se tornou de Tio Patinhas em Xerife do Inferno. Do mesmo Inferno a que conduziu as presentes gerações de portugueses, de pais, a filhos e netos, que agora aqui vivem e que desejarão libertar-se rapidamente de tamanho fardo e incorrigível incompetência.

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O Fim do Regime e os Capitães Donatários

Como aqui vim a escrever durante estes mais de dois últimos anos, Portugal esteve a ser conduzido para a tragédia económica, financeira e social. Aqui escrevi já há mais de um ano um artigo que intitulei de “PREC 2009 – Podridão Reaccionária em Curso”, onde defendia que o País estava a caminhar a passos largos para uma situação económica e financeira que seria tragicamente de podridão e de empobrecimento das actuais e futuras gerações.

Chegámos agora em Setembro de 2010 ao ponto final, o da ruptura, em que não há para onde olhar e fugir da triste condição em que todos nós que ficarmos nestas fronteiras nacionais vamos viver.

No topo desta condução política miserável está um homem pequeno, muito pequeno, arrogante, ilusionista, facilmente prestidigitador da realidade, versátil a prometer e a trair a sua palavra. Agora, no limite desta usura das capacidades de confiar dos portugueses que esta indigente governação criou, fruto das copiosas mentiras e encenações, das falsas vitimizações, dos enredos pessoais mal contados e atirados para debaixo dos tapetes do regime, tudo apanágios indesmentíveis do actual Primeiro-Ministro, Portugal está no fim da linha da sobrevivência financeira, económica, e mesmo soberana.

E de mais uma manobra inqualificável, o timoneiro desta obra desgraçada tenta passar as suas responsabilidades para outros, para aqueles que ainda há poucos meses lhe confiaram um plano de salvaguarda desta desdita e do já então previsível toque de finados deste regime.

Agora, em meios de Outubro de 2010, o que está na ordem dos termos desta conjuntura é não apenas um qualquer Orçamento de Estado mas, isso sim, a salvaguarda da natureza e da vigência do actual regime político. Mas porquê?

Porque agora não é mais sustentável aguentar uma comunidade de políticos de esquerda que, tendo governado Portugal durante mais de uma década, desfiguraram os valores e os comportamentos morais que a Nação considera aceitáveis, que se instituíram regalias e direitos injustificáveis, que desbarataram despudoradamente os dinheiros dos contribuintes, que aumentaram enormemente os impostos para fazerem deles o que entenderam, que viveram pendurados no Estado de que se tornaram seus absolutos capitães donatários.

O regime destes senhores da esquerda nacional, socialistas como se qualificam, criou uma cornucópia de imoralidades e de desbaratamento dos recursos nacionais, com uma enorme corte de correligionários e apaniguados montados na coisa e dinheiros públicos, e decidindo obras majestosas que transportam encargos incomportáveis para as próximas décadas e gerações de portugueses. E que condenam, numa despreocupada indiferença de justiça para com os mais fracos, ao empobrecimento as novas camadas de pensionistas e reformados aos quais o Estado não poderá futuramente garantir os níveis anteriores de rendimentos que atribuiu a outras gerações.

Perante este absoluto descalabro do regime, servido pela constante narrativa dos direitos inalienáveis e pela raiz utópica que a actual Constituição contém, que fazem ou dizem muitos dos principais dignitários ou donatários desse regime?

Mário Soares, que até há poucos meses estava indiferente e defensor da governação actual do seu camarada Sócrates, vem agora dizer repentinamente que a situação é muito séria. E que é necessário haver um entendimento para o tal Orçamento salvador.

E os tais paradigmas que ele defendia como necessários para um novo socialismo democrático na Europa e em Portugal e as responsabilidades desta condução mentirosa e para a tragédia ficam com quem?

Será que o Dr. Soares pensa agora de uma penada e viravolta que tudo isso fica apenas com o PSD e o Dr. Passos Coelho que deverá aceitar os ditames do Engenheiro Sócrates que até está a fazer o que é necessário imagine-se?

Mas também o antigo Presidente Jorge Sampaio, outro socialista bem à esquerda e que agora patrocina a candidatura do poeta Alegre a Belém, vem agora dizer bem alto e a plenos pulmões que estamos sobre uma linha ténue e que agora “já não existe mais vida para além do défice”. E que tudo está bem mais do lado do PSD e do Dr. Passos Coelho.

É este em inícios de Outubro, e deste Outono na nossa vida nacional e do seu regime, o coro diário e agora mediaticamente bem audível dos principais capitães donatários do regime, que agora acordaram da sua sonolência para os entendimentos indispensáveis de salvação da Pátria. Para a tal “Hora da Verdade” da Dra. Manuela Ferreira Leite de Setembro de 2009, lembrar-se-ão?

Mas estes são os mesmos donatários do regime, a que se juntam outros e outros mais menores na sua doação ao sistema que governa, que nada dizem agora como não disseram ao longo de todos estes últimos anos de governação socrática, sobre a respectiva volúpia dos gastos do estado socialista do Engenheiro Sócrates, das suas tendências megalómanas que deixarão o país entregue nas próximas décadas ao pagamento de dívidas colossais e ao de uma divida pública que terá encargos de juros anuais superiores ao que serão nessas datas as despesas de educação (5 ou mais mil milhões de juros ao ano em mais de uma década provavelmente), que certamente impedirão muita despesa iminentemente social, como o aumento aceitável e justo das pensões e reformas mais frágeis, ou tornarão improváveis muitos pequenos investimentos públicos reprodutivos e de proximidade nas nossas cidades e vilas de norte a sul, ou colocarão em causa certamente o sustento dos aumentos das despesas com o Serviço Nacional de Saúde ou com o Sistema Público da Educação.

Estas “boas almas salvadoras da Pátria”, os tais capitães donatários do regime e os seus adjuntos menores nesta salvação de vigésima quinta hora, que agora acordaram para o toque de finados da prestação socrática e socialista, e que assim vêem ameaçado o seu regime de um Estado superpotente e assistencialista que sempre defenderam em nome das utopias constitucionais e ideológicas que professaram e professam, querem agora “levantar-se de novo no seu esplendor” dos direitos inesgotáveis e graciosos – pagos pela falta de iniciativa, de economia e competitividade, de trabalho, de deveres e responsabilidades.
Chegaram tarde estes arautos do compromisso e da coesão, da ética da responsabilidade, da táctica de salvação temporária da República Portuguesa!

Portugal exige, tem de exigir, muito mais ao Governo e ao seu Engenheiro líder. A hora é a de cumprir Portugal e a de obrigar o Primeiro-Ministro a governar o País em nome dos interesses dos portugueses e não dos seus e da sua sobrevivência agora ou amanhã nos corredores do poder. Porque o Engenheiro socialista conduziu Portugal, com a sua teimosia, o seu ilusionismo, a sua inveracidade, a sua obstinação, e a sua falta completa de estratégia e de sentido de Estado e do futuro dos portugueses, a uma situação de tragédia anunciada.

Aos ditos capitães donatários do regime que agora se perfilam nos meios de comunicação, como os antigos Presidentes Mário Soares ou Jorge Sampaio, que são e sempre serão socialistas e correligionários políticos do actual Primeiro-Ministro, o que deveriam fazer agora, se ainda pensam poder salvar o seu regime, é toda a pressão sobre o seu camarada Engenheiro Sócrates para que negoceie com todos os que querem apresentar caminhos de futuro para Portugal, e sobretudo com aqueles que têm uma estratégia que permita inverter o caminho suicidário em que o País foi colocado. Está na hora, isso sim, de Sócrates assumir aquilo que deve e de respeitar escrupulosamente os deveres e os compromissos que vai ter de assumir não apenas com a oposição política parlamentar mas com o País e os portugueses. Por uma vez terá de ser assim estrita e obrigatoriamente!

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

República, Orçamento e Ética da Responsabilidade

Comemoraram-se ontem os cem anos da implantação da 1ª República, com cerimónias oficiais que habitualmente servem para os principais líderes políticos se dirigirem ao País. Foi o que ali fizeram uma vez mais o Presidente da República e o Primeiro-Ministro, nomeadamente.

O momento que atravessa hoje a República Portuguesa não é bom como agora todos ficámos recentemente a saber pelas palavras e anúncios do Governo, palavras e notícias que foram sendo sempre adiadas e negadas ao longo do último ano, pelo menos.

Aconteceu que as palavras mais ouvidas e proclamadas naqueles discursos oficiais de ontem foram as da coesão nacional, a do compromisso, a da convergência, e ainda também as do bom senso e responsabilidade.

Ao que agora se diz nos diversos cantos políticos sem excepção o momento desta nova República é bem inquietante, muito sério e, porventura, mesmo dilemático.

A ética da responsabilidade é então o conceito da ordem do dia, sem que os que a pronunciam e proclamam tenham o cuidado e o rigor de definirem com propriedade o que significam os termos do mesmo: ética e responsabilidade.

Desde logo, porque a ética tem como substância um conjunto inabalável de princípios, códigos de valorização do bem e do mal, do certo e do errado, da verdade e da mentira, da justiça e da injustiça, da equidade e da iniquidade, da honorabilidade e da desonra, da lealdade e da traição. E porque, depois, a responsabilidade que lhe vem associada significa, desde início, a capacidade de dar respostas, mas também de assumir resultados e a sua falta, os sucessos ou os insucessos, de prestar contas e fazer balanços, de agir em tempo útil, do rigor e da eficiência, e ainda o dar transparência das respectivas acções e inacções.

Acontece, contudo, que pela prática política, pelos resultados alcançados e a sua assunção, pela ocultação sucessiva de muitos dos dados da realidade nacional, em que o actual Primeiro-Ministro e o seu Ministro das Finanças, nomeadamente, têm sido pródigos, muita desta ética da responsabilidade cai que nem uma luva enorme e pesada sobre as mãos e as faces desses principais responsáveis do Governo em funções.

Desde logo e à cabeça a tal ética da responsabilidade deveria ser exigida ao actual Primeiro-Ministro e ao Ministro das Finanças, o primeiro como máximo responsável, e o segundo como o principal intérprete e actor das contas públicas nacionais e da respectiva situação financeira insustentável que o País ficou a saber agora que vive em 2010.

É pois sobre o Governo que deve recair em primeiro lugar a ética da responsabilidade, que tenha tradução efectiva na vontade de chegar a compromissos, na apologia da verdade das contas apresentadas, na transparência na prestação das acções e mandatos anteriores, e ainda também na demonstração do tal bom senso, seja lá em bom rigor e objectividade o que isso queira significar.

Agora em Outubro de 2010, mais de um ano depois das eleições legislativas que permitiram ao Engenheiro Sócrates continuar a governar como quis, quando se ouvem murmúrios troantes e vozes várias empenhadas em procurar transferir o ónus da tal ética da responsabilidade para a oposição à direita do PS, porque a da esquerda nem parece contar para esses arautos da estabilidade a todo o preço, isso parece simplesmente demais e configura uma inversão dos termos de um contrato negocial como é aquele que vai estar proximamente perante os portugueses na nossa Assembleia da República.

Não podem haver bloqueios antecipados à negociação política, que deverá ser feita democraticamente perante todos os portugueses que são os seus destinatários e alvos principais, e devem poder vir à liça as naturais diferenças de entendimento e de propostas políticas e orçamentais sobre as opções e os caminhos possíveis para Portugal nesta hora dificílima em que o Governo colocou o País. Só que para esta negociação difícil é necessário não esquecer e também ter bem presentes as características pessoais do líder do Governo que têm ficado bem visíveis nos vários anos de mandato governativo que ele já tem.

Negociação não é nem pode ser para os portugueses a imposição de um modelo único, de uma única solução, de certas medidas e não outras alternativas. Portugal merece agora nesta hora dilemática que os seus protagonistas políticos mandatados discutam as diversas soluções e caminhos que o País terá de trilhar e aceitar para ter um novo rumo de esperança no seu futuro colectivo.

O que se percebe em muitas vozes que ecoam já na praça pública, antes mesmo de ser conhecido o projecto de Orçamento de Estado que o Governo está obrigado a apresentar à Assembleia da República, é a tentativa de impor subliminarmente que este princípio de gestão da coisa nacional que de denomina como ética da responsabilidade deve vir a desaguar numa formal aprovação desse Orçamento, qualquer que seja o seu conteúdo efectivo. O qual ainda se desconhece até agora no seu essencial, pois que apenas foram anunciadas pelo Governo, no final de um Conselho de Ministros, algumas das medidas e propostas que aumentam impostos, reduzem salários e prestações sociais, ou congelam pensões. O que convenhamos, ainda que sendo tudo quanto o Governo desmentia até há bem pouco como sendo necessidades face ao PEC II aprovado em Maio passado, é mesmo assim ainda apenas uma parte do que aquele instrumento de governação do Estado tem realmente de ser.

Por isso, não podemos esquecer-nos, nesta apressada tentativa de aprovar um Orçamento para 2011, dos elementos que definem o perfil da liderança do Governo que nos tem vindo a ser apresentado pelo seu responsável máximo, o Engenheiro José Sócrates. Poucas dúvidas haverá hoje em muitos de nós de que o actual Primeiro-Ministro sofre de amplas limitações no domínio da confiabilidade, da veracidade, e até mesmo da própria legitimidade com que tem vindo a conduzir os negócios de Estado e os destinos dos portugueses.

Quem poderá hoje associar o Primeiro-Ministro aos bons e sãos princípios de uma liderança política que seriam os da lealdade, da equidade, da justiça, da integridade, da honestidade e da confiança?

Estes são os princípios que definem e orientam uma liderança política eticamente responsável e que tanto a podem fazer oscilar para o lado da estabilidade, se mantidos escrupulosamente ao longo do tempo de mandato, como para o lado da desintegração e da destruição se forem continuadamente desprezados nesse mesmo período de condução da vida política. Uma liderança eficaz a prazo implica, por conseguinte, que os líderes principais sejam portadores de princípios reconhecidos, sendo que esses princípios devem constituir os pontos cardeais da acção política desses líderes. O que se deve esperar destes líderes políticos é que se movam segundo os princípios que enunciem publicamente, que estes tenham uma base moral maioritariamente aceite, que conduzam as suas escolhas e acções segundo essas bases morais, e estejam sempre disponíveis para se sujeitarem ao escrutínio público responsabilizando-se perante os seus eleitores pelas suas escolhas e as consequências gerais que delas decorrem.

Ora, José Sócrates mostrou ser tudo menos um líder confiável, que honra os seus compromissos e propósitos, que não muda ao sabor das circunstâncias que se abatem sobre a sua intransigência e obstinação, que é capaz de lidar com a realidade quando ela desfaz dia a dia a sua ilusória vontade de agir, razões estas que são mais que suficientes para que agora o País e os portugueses lhe imponham um mandato orçamental muito exigente. E que este mandato contenha medidas e acções que estimulem e salvaguardem a economia, o nível de vida das famílias, e as condições de dignidade dos mais pobres, ao mesmo tempo que tenha elementos consequentes com a indispensável redução das despesas públicas, tão obrigatórias para que as finanças nacionais resgatem a credibilidade perdida nestes dois últimos anos de Governo e se enderecem para uma trajectória de efectiva consolidação pela redução dos encargos.

O Governo deve vir a ter aprovado um orçamento para 2011, mas um bom orçamento, que faça o que é imprescindível fazer face à situação a que se chegou, mas com a devida e rigorosa salvaguarda dos equilíbrios económicos e sociais que tentem defender as condições de vida das famílias e das empresas portuguesas – porque é da saúde e do vigor destas que dependerá a esperança de vir a ter um Portugal melhor no futuro.

Nota Explicativa: Alexis de Tocqueville, diplomata francês, analisou há mais de 150 anos a realidade democrática americana num livro que ficou como sendo um dos textos básicos da ciência política dos dias de hoje (“A Democracia na América”). Dizia ele a certa altura o seguinte: “Muita gente, na Europa, pensa sem o dizer ou diz sem o pensar, que uma das grandes vantagens do sufrágio universal é a de colocar homens dignos da confiança do povo na direcção dos assuntos públicos. O povo não seria capaz de governar-se a si próprio, dizem, mas deseja sinceramente o bem do Estado, e o seu instinto nunca falha quando se trata de designar para exercer o poder aqueles que estão animados do mesmo desejo e são mais capazes.
Quanto a mim, o que vi na América não me leva de modo algum a pensar que assim seja. Quando cheguei aos Estados-Unidos, fiquei surpreendido ao ver quanto mérito havia entre os governados, e quão pouco se encontrava nos governantes. É um facto notório que hoje, nos Estados-Unidos, os homens mais notáveis raramente são chamados a exercer funções públicas e é forçoso reconhecer que isto se foi acentuando à medida que a democracia ultrapassava todas as suas antigas limitações. É evidente que, nos últimos cinquenta anos, a raça dos homens de Estado americanos escasseia notavelmente” (A Democracia na América, Alexis de Tocqueville, Livro I, 1835).

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O “Governo Prozac” e Portugal


“E vem-nos à memória uma frase batida”, dizia a canção, e continuava, “Hoje é o primeiro dia do resto da tua vida”. Melhor mesmo, hoje é o primeiro orçamento do resto das nossas vidas. Estamos na hora pequena em que “A Rosa Murchou!”.

E agora o nosso superlativo “Governo Prozac”, que distribuía optimismo em carradas, vendia regalias eternas, suspirava por cada décima de produto ou de emprego, proclamava grandiosos projectos e uma modernidade interminável, esse “Governo de Reengenharia” contabilística está a dar de caras com as contas para 2011. E vai ter que apresentar o seu Orçamento de Estado, com as suas escolhas e prioridades ao País e à União Europeia e aos olhos de águias dos nossos financiadores externos.

Entretanto, com as danças, contradanças e cenas bacocas ministeriais do dito Governo, veio-me à memória que o lema com que hoje Portugal está confrontado, “A Hora da Verdade”, era um dos que constavam dos cartazes da assaz vilipendiada e odiada doutora Manuela Ferreira Leite na campanha eleitoral do ano passado, e que eu cheguei a ver exibidos vezes sem conta na rotunda do Centro Sul em Almada.

Não, não, dizia alto e a bom som o nosso Engenheiro em todas as frentes mediáticas e outras, essa verdade da doutora era mentira, pessimismo puro, falta de querer fazer, porque a verdadeira hora era a que ele tinha para dar a Portugal, a das novíssimas promessas, das grandiosas obras republicanas, da moderníssima estirpe da “Rosa”, púrpura de Lisboa até aos arredores de Madrid e da Europa.

Não estava do lado certo, claro, aquele prenúncio sulista e elitista da Senhora Ferreira Leite. Portugal precisava do engenho e arte magníficos do “Governo Prozac” por mais uns quantos anos, longos e bons para tudo e todos, por consequência.

Mas agora, chegados a Setembro de 2010, já com dois PEC aprovados entrementes, parece que a tal “Hora da Verdade”, muito pequena e tristonha, está chegar em cima das nossas cabeças, provavelmente com uma adjunta suspensão das inúmeras virtualidades da nossa democracia intemporal e insigne que muitos desacreditavam que pudesse ser possível acontecer neste Portugal abrilista, fecundo de direitos e promessas para sempre.

Afinal, como agora parece estar visível e quantificável, os espanhóis e os irlandeses, e mesmo os próprios gregos já intervencionados pela união Europeia e FMI, lá foram fazendo o seu duro trabalho enquanto que aqui o “Governo Rosa” descarrilou e, agora mesmo, ainda falta com os dados à Republica e à oposição. E já agora também aos portugueses que elegeram bem enganados o Senhor Engenheiro há praticamente um ano, com as suas benevolentes promessas do paraíso na terrinha rectangular desta ocidental praia.

Valia a pena, se me permitem a sugestão amável, ir agora rebuscar as palavras da tal “Velha Senhora Ferreira Leite” (bruxa como alguns dos nossos denodados universalistas e humanistas intrépidos então também lhe chamaram), avisadas como agora parecem ser finalmente, quando se vislumbram tão decisivamente os restos deste regime glorioso, tão correctamente glorificado e tão prestimoso, enfileirado no “Governo Prozac” do Engenheiro Sócrates. Aquele que “prometia mais que a gesta humana”, e um Estado omnipotente e sagrado, com direitos universais e gratuitos, tal como escrupulosamente dispôs a nossa intocável e mui eternamente socialista Constituição da República Portuguesa.

Só que neste momento exacto de 2010 estão à vista as contas desta República. E os credores da dita, e também já certa desdita, nossa e das próximas gerações de portugueses, estão a olhar preocupadamente para este nosso desgoverno. E as carradas de Prozac que alimentaram esta ilusória e mentirosa governação já não fazem efeito ao mais alto nível. Por isso, se vem assistindo a uma trágica encenação do Primeiro-Ministro e dos seus mais fiéis seguidores, da qual tenta agora descolar em último recurso o Ministro Teixeira dos Santos. Tarde, muito tarde, e na tal má hora, “A Hora da Verdade”, que já nos cai violentamente e cheia de imposturas em cima.

E que faz ou parece querer fazer o homem do leme? O homem do leme quererá mesmo fugir? Agora que já nos meteu no buraco enormíssimo que vai custar gerações a liquidar? Deixou de nos dar a tomar o “Governo Prozac”? Já se terá passado mesmo para o “Third Life”?

E como dar crédito ao Ministro das Finanças, que deixou assinar as inumeráveis Parcerias Público-Privadas para as estradas, os hospitais, e a alta velocidade, e aumentar as despesas do Estado para as quais garantiu milhões e milhões de euros de impostos novos? Que continuou alegre e despreocupadamente a alimentar todos os milhares de cargos da boa gente das muitas centenas de organismos e empresas públicas, e o aumento imparável da dívida pública e do endividamento das empresas públicas que tutelava? Como vem agora à superfície o Doutor Teixeira dos Santos, repentinamente, para desdizer todo o Governo que andou nestes últimos tempos em circos de inaugurações e psicologia barata alimentada a carradas de Prozac? E quer mais impostos, e outras receitas e talvez mesmo congelamentos salariais, para poder continuar alegremente a alimentar a despesa pública sem qualquer esforço sério e credível de contenção?

Por mim, acho mesmo, depois da baixeza da encenação “Silva Pereirista” de há uns dias, inusitadamente no final de um Conselho de Ministros desta República, que foi encomenda empaticamente Socrática, que o Dr. Passos Coelho deve ter chegado às mesmas conclusões da Doutora Manuela Ferreira Leite sobre a transversa honorabilidade e confiabilidade política e pessoal deste Primeiro-Ministro e dos seus mais íntimos fiéis. O qual terá querido negociar, ou melhor impor à oposição em disciplina prévia, tudo quanto é o contrário do que andou a dizer e a fazer, depois de ter circulado cá pelo “Terreiro” de norte a sul, durante os últimos meses, a olhar para as praias e a atrelar-se a tudo quanto eram inaugurações, tijolos e pedras.

Isto é francamente de mais para qualquer paciência santificada que seja, e a do doutor Passos Coelho nem parece que a tal sagração queira ou possa aspirar!

Para muitos dos que vêem tudo isto que agora se vem passando como uma descomunal e maquiavélica encenação montada pelo homem do leme deste “Governo Prozac” nem é estranha a tentativa dele para intentar um processo extemporâneo de fuga, e apressada, às suas responsabilidades. Só que agora vai ter de arcar com tudo quanto criou, de enfrentar a dureza da realidade que sempre negou, e dizer aos portugueses o contrário daquilo que ainda há semanas dizia em cada inauguração de uma qualquer creche deste País. E terá de apresentar o seu Orçamento de Estado a Portugal, defendendo as soluções que preconize para os problemas que sempre negou ou esqueceu.

Os portugueses irão, finalmente, mas com mais pobreza e miséria de muitos dos seus familiares e concidadãos, tomar consciência das contas que o Engenheiro Sócrates e o seu prestimoso “Governo Prozac” deixarão para as próximas décadas, mas igualmente do estado miserável a que conduziram a economia e as finanças públicas de Portugal. E saberão também, ao mesmo tempo, contar e recontar os muitos milhares de empregos bem pagos que nestes mais de cinco anos foram criados para os camaradas e apaniguados da “Rosa Socialista” em todos os serviços do Estado, empresas públicas, e assessorias ministeriais, nomeadamente. E ainda também virão a conhecer as centenas e centenas de milhões de euros das PPP que ficaram para os bancos e as empresas deste regime de mentira que deixa o País moribundo económica e financeiramente.

Estou há muito com Medina Carreira, com Hernâni Lopes, com Silva Lopes, com António Barreto e mesmo com Eduardo Catroga. Este último bem avisou há um ano na Associação Industrial Portuguesa, com mais de sessenta diapositivos e contas feitas ao milhão de euros, como devia fazer-se renascer Portugal desta decadência e empobrecimento vil em que fomos metidos por esta governação de más contas e responsabilidades.

Sim, porque o máximo responsável deste “Governo Prozac” até pensou em fugir agora, deixando Portugal a arder! E que atrás dele viria a União Europeia e o FMI algum tempo depois tratar de toda esta insustentabilidade para que avisava há poucas semanas o actual Presidente da República.

Sustentável mesmo é a leveza deste Engenheiro, homem político que apenas quer o poder pelo poder e a todos os custos, e que agora pensava poder irresponsavelmente escapulir-se para um qualquer exílio do “Third Life”!

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Os Anti-Capitalismos de Portugal

Em Portugal há muitos anti-capitalistas, muito discurso anti-capitalista, muitíssimo conceito e preconceito contrário à iniciativa privada, ao lucro, ao mérito e ao sucesso individual, à busca de um lugar individual de cada qual na sua vida pessoal e familiar, à independência e à autonomia dos indivíduos perante uma engrenagem da sociedade e aos mecanismos e ao poder supremo do Estado.

Este tipo de narrativas anti-capitalistas e anti-liberais estão na nossa matriz republicana e constitucional, nos líderes políticos da esquerda radical e totalitária do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, mas também em outros sectores da opinião pública e mediática, nos sindicatos, nos corredores da administração pública, ou em certos discursos e representantes do topo da hierarquia da própria Igreja Católica portuguesa.

Por isso, na nossa praça pública há tantos que agitam e suspiram por novos paradigmas económicos, políticos, sociais ou até mesmo culturais. E estas novas procuras de cura para todos os males do capitalismo nacional aproximam-se rapidamente das tradicionais utopias do fim da história, da redenção do homem português, de um novo império das virtudes e da imensa e eterna justiça social.

Portanto, auguram-se outros paradigmas, novos modelos, muito anti-capitalistas e anti-liberais, onde o Estado iluminado redimiria todas as flagrantes injustiças e misérias abjectas do nosso capitalismo, neoliberal como agora é convenientemente apelidado.

Só que há algumas questões que se podem e devem colocar a esses prestimosos arautos da salvação das almas subjugadas pelo capitalismo e pela burguesia egoísta e predadora.

Exemplificando para o Portugal de 2010, com os seus problemas conhecidos mas também muitas vezes negados pelos novos apóstolos da utopia anti-capitalista, como é que esses paradigmas salvíficos responderiam aos problemazinhos que corporizam a nossa triste realidade.

Enquanto se procuram novos paradigmas que estejam para além do capitalismo e do comunismo, como se resolvem os casos absolutamente insuportáveis dos quase setecentos mil desempregados portugueses? Será com as soluções tipo Bloco de Esquerda de fazer entrar mais cem mil pessoas nos quadros da Administração Pública? Ou com as do Partido Comunista de voltar a nacionalizar as empresas de grande dimensão, hoje privadas? E quem vai dar emprego às centenas de milhares de mulheres e homens de família, muitos de meia-idade e sem quaisquer qualificações e experiências de trabalho diferente da que sempre tiveram nas respectivas fábricas desaparecidas ou falidas?

Convém dizer que o nosso fantástico capitalismo, que é tão violentamente atacado pelos diversos cultores anti-capitalistas portugueses, apenas era antes de 1974, com significado nacional e internacional, um punhado de empresas protegidas da concorrência internacional e pertença de meia dúzia de grupos económicos. Em tudo o mais esse capitalismo português era miserando, com milhares de empresas tecnologicamente fragilizadas e inundadas de mão-de-obra sem qualificações, e em sectores industriais que interessavam à divisão do trabalho que existia entre a Europa do Norte e a do Sul.
Mas aquele pouco capitalismo com algum potencial e significado interno e externo foi todo expropriado e nacionalizado até aos anos 90, obedecendo a tudo menos à lógica capitalista da concorrência mundial.

E o que é, então, agora em 2010 esse nosso tão ignóbil e despudorado capitalismo? Meia dúzia de bancos privados altamente endividados e dependentes dos financiamentos externos pertencentes a milhares de accionistas muitas vezes estrangeiros. Mais algumas outras grandes empresas, também altamente endividadas, sobretudo de sectores de bens não transaccionáveis, como a EDP, a REN, a GALP, a PT, e mais umas outras parcas centenas de empresas de dimensão média. E que todas juntas pagam praticamente todo o IRC de Portugal, praticam bons níveis salariais para uns quantos milhares de quadros e liquidam parcelas relevantes do IVA e do IRS nacionais.

Porque é conveniente recordar a realidade do restante capitalismo voraz de Portugal, apregoado pelos ideólogos anti-capitalistas, como sendo correspondente a mais de 98% das nossas empresas, as quais são de pequena dimensão e com menos de 10 trabalhadores; e que também cerca de setenta por cento de todas as nossas empresas não pagaram IRC em 2010 porque não tinham tido resultados positivos no ano anterior, que já era de crise económica e financeira pronunciada.

Por toda esta real fraqueza do capitalismo português é que em Maio passado, com o PEC II, quando o Governo decidiu aumentar as taxas do IRS para 45% aos ricos do País, que se definiu serem todos aqueles que ganham e declaram mais de 150.000 euros por ano, apenas existiam neste enormíssimo capitalismo neoliberal e explorador cerca de 30 mil agregados familiares nessas condições, o que daria qualquer coisa como 120.000 pessoas envolvidas nesses mantos diáfanos da nossa grande burguesia. E esse acréscimo de imposto ficou cifrado em cerca de 30 milhões de euros (uma majestática soma para acorrer aos mais que justos desejos e dispêndios do nosso grandiloquente Estado).

Então que vigoroso capitalismo é este em que existe em Portugal em 2010? Que justifique essas buscas de um qualquer novíssimo “Graal Anti-Capitalista”?

E será esse exercício de alquimia político-ideológica que vai ser capaz de criar empresas, empregos e riqueza para distribuir por trabalhadores e pelos mais pobres e excluídos? Sem capitalismo a sério, sem novas empresas de todas as dimensões, será possível que o futuro de milhões de jovens qualificados que vão estar no mercado de trabalho nas próximas décadas e as centenas de milhares de actuais desempregados encontrem em Portugal espaço para organizarem dignamente as suas vidas pessoais e familiares? Onde e por que entidades serão originados os recursos financeiros e económicos que pagarão os nossos sistemas sociais de saúde, de educação, de reformas e pensões de mais de três milhões de pessoas actuais que serão ainda mais futuramente? E como será paga a enormíssima dívida pública acumulada (que já se aproxima a passos largos dos cem por cento da riqueza anualmente criada no País)?

Portugal terá mesmo viabilidade económica e equilíbrio social ou decairá até próximo das circunstâncias do início dos anos noventa do século anterior, continuando a perder décadas como a deste início de século o foi? E então a ideologia e as utopias anti-capitalistas que tantos defendem, disseminam e propagandeiam na esquerda comunista e socialista, servirão para quê e a quantos portugueses?

Não haverá antes, pelo caminho de apodrecimento democrático e do regime a que se vem assistindo flagrantemente, uma qualquer Maria da Fonte, entretanto? E para que outras utopias se refugiarão progressivamente os dirigentes desta deslocada narrativa anti-capitalista, que apregoa exaustivamente os direitos inesgotáveis, as promessas e das possibilidades do “Sal na Terra”, ou o tudo e o mais, sempre?

Bem ao contrário dessa idealização anti-capitalista de raízes indisfarçavelmente totalitárias, esta hora portuguesa que vivemos em Setembro de 2010 é mesmo aquela da última estrofe do poema Mensagem de Pessoa!

O futuro das nossas filhas e filhos e até mesmo o meu, que ainda estarei mais dez anos pelo menos a servir o Estado, num clima reinante de completo despudor que está inequivocamente instalado e onde eu já não revejo a noção de serviço público com que iniciei as minhas funções nos final dos anos 70 do século vinte, está ameaçado e muito, e o céu cinzento carregado está aqui mesmo já ao virar da esquina.

Chama-se muito provavelmente FMI! E repetirá 1983-85 sem Mário Soares, Silva Lopes, Hernâni Lopes ou até mesmo Medina Carreira, e com muito pouca atenção aos cânones da nossa Constituição e democracia. E o Professor Medina Carreira, o tal catastrofista e alarmista de serviço, como foi sendo apelidado nos últimos anos pelos idiotas úteis do optimismo propagandístico e da infâmia, não profetizou, apenas se dedicou a fazer as contas do regime, e desiludiu-se, tal como eu e muitos outros, da sagração ideológica que nos foi vendida desde 1976, e que ainda tem consagração no Preâmbulo magnânime da intocável CRP.

Paradigmas, que paradigmas anti-capitalistas, quais utopias deslocadas e insanas, quando é já o comboio a alta velocidade que está a vir do fim do túnel direitinho às nossas cabeças?

José Pinto Correia, Economista

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Outras Políticas Públicas para Portugal


Desde há muitos anos que acompanho, por iniciativa individual profissional e também académica, o que em vários países do chamado mundo anglo-saxónico têm sido as experiências de reinvenção e de nova gestão da administração pública e universitária, e também das iniciativas institucionais e de orientação estratégica para a redefinição das políticas públicas sectoriais.

Assim, tenho contactado frequentemente com várias das inúmeras organizações pensantes (os denominados “think thanks”) do Reino Unido e dos EUA em diversas daquelas áreas das funções tradicionais do Estado. Acompanhei também com especial interesse o enorme esforço de reforma, melhor de reinvenção, da administração americana conduzido durante os mandatos do Presidente Clinton, alicerçada com suporte numa concepção teórica e académica completamente inovadora à época, a qual fez subsequentemente “escola” internacionalmente, e foi depois utilizada em países como a Nova Zelândia e a Austrália e ainda mais recentemente durante os mandatos do Partido Trabalhista de Blair e Brown no Reino Unido.

Essa intervenção longa dos vários anos de dois mandatos presidenciais de Clinton, em que foi proposta e concretizada uma profunda reinvenção da administração americana, tornou possível passar de um défice federal enorme, herdado da anterior presidência, para um significativo excedente orçamental, através de um vastíssimo conjunto de mudanças na concepção, gestão e estratégia de muitos departamentos e serviços públicos.

Em Portugal, estas preocupações reformadoras ou de reinvenção da nossa Administração Pública ou mesmo do Estado se falarmos mais genericamente, bem como os novos modelos de análise organizacional e funcional e os correspondentes instrumentos de formulação de políticas públicas têm sido quase completamente ignorados. Não é possível assim encontrar ainda hoje as fundamentações teóricas modelares, os estudos e documentos que têm substanciado as intervenções recentes de mudança na Administração Pública, que quase se esgotaram ou nas iniciativas do “Simplex” ou em reformulações das carreiras ou dos processos de avaliação do desempenho, com carácter meramente jurídico e mesmo assim com “lutas” muito equívocas e lideradas apenas pelos respectivos sindicatos interessados.

Em nenhum momento destas parcas mudanças dos últimos anos foram tentados exercícios de verdadeira mobilização das vontades e conhecimentos profundos dos quadros da nossa administração para repensarem a estratégia e planeamento, a organização e os processos de decisão dos seus departamentos e serviços públicos, situação que foi devidamente acautelada e amplamente estimulada na experiência do Presidente Clinton nos EUA.

Mais ainda, o Governo português não dispôs nunca no passado nem continua ainda hoje a dispor de qualquer “unidade estratégica” similar aquela que trabalhava junto do Primeiro-Ministro Britânico trabalhista e que foi durante anos produzindo estudos interdepartamentais profundos e devidamente referenciados do ponto de vista académico-científico, que funcionavam como adequados meios fundamentadores das políticas publicas a prosseguir nesses múltiplos domínios da intervenção governativa.


Mais ainda, todos aqueles trabalhos profundos de análise e propositura de intervenções nos diferentes espaços da vida pública nacional do Reino Unido estavam e ainda continuam agora a estar disponíveis em linha na internet para avaliação e estudo de todos os cidadãos e organizações daquele Reino.

Também não existe entre nós uma entidade como o FORFÁS da Irlanda que publica estudos e documentos sobre várias áreas da governação, nomeadamente virados para as estratégias que o país tem de prosseguir no concerto global nesses diferentes sectores económicos e sociais. Ali se podem encontrar permanentemente disponíveis variados estudos detalhados sobre a competitividade do país, sobre as escolhas nos domínios da ciência e tecnologia, sobre os caminhos de evolução do ensino superior e universitário, ou mesmo sobre as estratégias de desenvolvimento económico e empresarial em vários sectores da economia irlandesa.

Em Portugal, por outro lado, que eu tenha conhecimento, também nunca foi publicado pelo Ministério das Finanças e da Administração Pública ou pelo da Economia e Inovação qualquer documento governamental que referenciasse modelos de gestão e fundamentação de políticas públicas, como por exemplo os que se referem às políticas baseadas em evidências (“evidence-based policies” tão conhecidas no mundo anglo-saxónico). O que foi conhecido até hoje foi um documento bastante frágil do ponto de vista conceptual sobre o denominado “PRACE”, que era afirmado pelo Governo como o instrumento modelar da sua intervenção reformista na Administração Pública ou no Estado se assim preferirmos considerá-lo. E se formos, por exemplo, verificar os sites do Ministério da Ciência e Ensino Superior ou da Economia, Inovação e Desenvolvimento poderemos constatar um panorama comparativamente confrangedor com o que é facilmente verificável existir em sectores governamentais similares no Reino Unido.

Também, por outro exemplo, em Portugal não é ainda hoje possível dispor de um qualquer centro de estudos sobre a economia e a gestão da educação e, o que ainda é mais invulgar, de uma qualquer entidade universitária que investigue comparativamente a gestão/administração das universidades, contrariamente ao que facilmente se reconhece existir em países como os EUA, o Reino Unido ou mesmo a Holanda, a qual no caso da gestão universitária tem na Universidade de Twente há quase duas décadas o “Center for Higher Education Policy Studies” (“CHEPS”) que é uma indiscutível referência mundial. E neste caso particular pode facilmente aceder-se aos diversíssimos estudos que sobre a gestão universitária europeia e mundial aquele “Centro de Estudos” sediado na Holanda tem produzido ao longo destas últimas décadas.

Em Portugal, infelizmente até hoje não têm aparecido entidades públicas ou privadas capazes e com a ambição ou a vocação para promoverem o estudo comparado de muitas daquelas experiências de reinvenção, reforma ou nova gestão pública, as quais têm tido tradução em vários países, como acima referido, num conjunto de novas e mais eficazes políticas públicas sectoriais. Desde logo, o nosso Instituto Nacional de Administração não tem sido entidade activa e manifestamente empenhada em estudar essas experiências estrangeiras que foram levadas a cabo nas últimas décadas em vários países da OCDE, tendo realizado até hoje uma fraca produção de estudos e outros trabalhos de investigação dessa natureza. E mesmo no último Congresso da Administração Pública, realizado há alguns meses no final de 2009, estudos dessa natureza praticamente estiveram uma vez mais ausentes das discussões, e os discursos dos membros do Governo com a tutela da Administração Pública que ali intervieram publicamente foram sobre essas temáticas completamente vazios.

Portugal está, assim, muito longe de demonstrar capacidades de pensar e desenvolver concepções estratégicas para muitos dos sectores da vida pública. As políticas públicas sectoriais, departamentais e interdepartamentais ainda não gozam nem do prestígio nem do investimento organizacional e dos impulsos governamentais que a complexidade da gestão e desenvolvimento estratégico de muitos sectores de intervenção do Estado e da Administração Pública justificariam. Há, portanto, um longo caminho de melhoria da concepção das novas políticas públicas em Portugal, que merece tanto o esforço da sociedade civil e das suas respectivas organizações, como da própria orgânica ministerial, quer ao nível da chefia do gabinete quer dos próprios ministérios e dos seus correspondentes departamentos; sem esquecer também a indispensável coordenação interdepartamental que promova o estudo e a implementação das modernas políticas multissectoriais.

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 14 de setembro de 2010

O Desporto e a Cidade em Portugal (Notas de Futuro)

Este texto foi originalmente publicado no BLOG da Colectividade Desportiva e agora aqui se republica sob o mesmo título.
Os países estão hoje envolvidos em processos de criação de riqueza que assentam na promoção de actividades económicas, sociais e culturais que apresentam valor e funcionam como elementos fundadores de bem-estar e qualidade de vida. As empresas são os principais criadores dessa riqueza e são também elas que permitem aos diferentes países e espaços económicos e geográficos competirem pela afirmação das respectivas capacidades e potencial.

As cidades foram sempre historicamente os principais centros criadores e acumuladores de riqueza, pois agregam grandes massas populacionais, mobilizam projectos individuais e colectivos de consumo e produção de bens e serviços, sobretudo daqueles que mais inovam e acrescentam valor em cadeia. Por isso, as cidades continuarão a ser no futuro as sedes naturais de muitas das melhores e mais bem sucedidas iniciativas empresariais lucrativas e das não-lucrativas que geram as oportunidades das carreiras e das vidas profissionais e familiares, bem como das diferentes e novas formas de garantir a organização em rede das iniciativas que geram valor e diferenciação competitiva.

As cidades organizam hoje com cada vez maior capacidade autónoma os seus espaços naturais e alargam-se cada vez mais para além dos seus limites geográficos tradicionais. A gestão moderna das cidades vai complexificar-se e obrigar a contemplar um novo conceito para o seu planeamento e para os modos como estão capazes de atraírem novas actividades, actores e projectos.

A vida das cidades competentes e eficazes na sua capacidade de afirmação global e nacional tem de estar cada vez mais intensamente aberta às iniciativas que organizem recursos e factores económicos e tecnológicos competitivos a escalas globais, que possam ultrapassar as circunstâncias nacionais e locais e possam inserir-se nas cadeias mundiais de actividades e valor.

As cidades podem e devem, por isso mesmo, acompanhar as grandes tendências de evolução produtiva e científico-tecnológica, abrirem espaços de organização em rede abertos ao mundo para a geração e organização de novas empresas e projectos. Pois é óbvio que o espaço natural de intervenção das cidades principais de cada país passou a ser o Mundo, e sempre que justificado os espaços regionais integrados do ponto de vista económico e/ou político (como por exemplo a União Europeia).

Evidentemente que cada cidade tem o seu contexto nacional por excelência onde está integrada; e para além deste também pode e deve conhecer detalhadamente as circunstâncias e as potencialidades ou constrangimentos da sua inserção territorial “microgeográfica”. As cidades têm, assim, uma autonomia estratégica e de gestão político-económica, social e cultural que já se não compadece com as intervenções tradicionalmente centralizadoras do poder político e governamental.

Assim sendo, o poder central do Estado tem de passar a transferir ou devolver um conjunto de poderes e competências mais alargados para a esfera de intervenção autónoma das cidades. E estas organizarão especificamente essas esferas de intervenção, com base no mais detalhado conhecimento e análise das suas próprias realidades, perspectivando com recurso a prospectivas de largo prazo as respectivas estratégias de desenvolvimento.
Nesta nova organização dos poderes das cidades cabe sem margem para dúvidas a da definição da sua “estratégia de desenvolvimento desportivo”. E para a sua fundamentação não servem modelos já ultrapassados das eras de centralização do poder do Estado.

As cidades têm, nestas novas circunstâncias da sua inserção global e nacional, de conceber as suas intervenções e objectivos estratégicos para o desporto em função das suas análises territoriais, populacionais, de recursos humanos e naturais, das infra-estruturas existentes de onde partem, das suas capacidades de mobilização de lideranças para o desporto, das estruturas organizativas disponíveis e das necessárias, por exemplo. E na definição destas estratégias de desenvolvimento desportivo, as cidades têm de fazer participar todos os seus agentes próprios, desde dirigentes a atletas, pais e educadores, escolas, clubes desportivos e culturais, empresas e empresários, organizações sociais e de trabalhadores.

A estratégia de desenvolvimento desportivo das nossas cidades modernas e abertas à competitividade internacional tem de ser o resultado de um amplo processo de envolvimento e participação de actores interessados e envolvidos no e pelo desporto para poder ser trabalhada com a indispensável profundidade e poder ter a efectiva e atempada operacionalização. E neste amplo processo de participação tudo se pode ganhar: as pessoas, os praticantes ou atletas desportivos, as organizações desportivas, empresariais e patrocinadoras, as vontades e a ambição e os novos projectos.

No fim destes novos entendimentos do perspectivar do contributo estratégico das cidades na promoção de mais e melhor desporto, quem ganha é o desporto, a cidade, e o papel do desporto na cidade nova e no país em geral.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Crise e Orçamento: Insustentabilidade e Compromisso?

A natureza e as características da crise económica, financeira e social portuguesa tem parecido inequívoca a muitos dos intervenientes na vida política nacional, desde logo ao Presidente da República que a nomeou recentemente como insustentável, mas também aos líderes dos partidos da oposição à direita do Governo. Só para o Primeiro-Ministro e muitos dos seus apagados ministros, a gravidade da crise nacional tem aparecido branqueada, aqui e ali por umas pequenas décimas de crescimento económico semestral, por uma momentânea paragem decimal do número de desempregados, ou ainda por um qualquer investimento público ou privado numa creche, num hospital, numa escola ou até sabe-se mais o quê.

Agora está na ordem do dia o Orçamento de Estado para 2011 que o Governo irá brevemente apresentar ao Parlamento e ao País. Sobre o seu conteúdo, opções, prioridades políticas e estratégia em que o mesmo se insira para o crescimento económico nos próximos anos sabe-se zero, nada mesmo.

Não diz uma palavra o Primeiro-Ministro, nada diz o Ministro das Finanças e estão calados todos os restantes Ministros sobre quaisquer opções ou linhas de política das suas respectivas áreas de governação. O que paira no ar são as “boutades de reentrada” do Senhor Engenheiro e dos seus correligionários de partido à volta da magnânime defesa do estado social e do património geneticamente puro e intocável da Constituição da República a esse respeito e não só.

Enquanto que ao mesmo tempo o maior partido da oposição volta a anunciar as duas condições mínimas que tinha fixado há algumas semanas para poder viabilizar o dito Orçamento de Estado, em defesa da sua noção de responsabilidade nacional e de contributo para a manutenção da tão prestimosa estabilidade governativa, sirva lá para o que servir, pelo menos até à eleição do próximo Presidente da República.

A crise que era gravíssima e insustentável desaparecerá com que estratégia do País, com que escolhas de políticas, prioridades e opções? E com que reestruturação ou redefinição do Estado?

Não sabemos, não viremos a saber proximamente, porque se houver o pré-anunciado “tango orçamental”, a convergência entre os dois maiores partidos, o compromisso mínimo necessário, tal “engenharia democrática maior” já tem a bênção prometida do actual Presidente da República, que ainda agora anunciou publicamente a sua vontade para tal beneplácito régio a esse “negócio inter-pares”.

Portanto, o insustentável de há poucas semanas pode esperar mais um ano, melhor dito mais uns seis meses, pelo menos. Depois, logo se verá se tudo voltará a mudar no mundo para ficarmos de novo insustentavelmente à beira do abismo profundo e da morte rápida.

Porque isto dos “negócios maiores” da nossa afamada República laica tem as suas variantes, umas em fá sustenido, outras em dó maior e outras em ré bemol. Os réus deste destino assim cumprido já se conhecem agora, vão continuar a conhecer-se nos próximos meses e anos desta década (a caminho da perdição): os muitos milhares de desempregados e o empobrecimento geral dos restantes portugueses!
Muitas centenas de milhares, dos melhores e mais bem preparados do ponto de vista educativo, sairão à procura de outras paragens, como o fizeram nestes últimos dez anos mais de setecentos mil outros portugueses.

É assim, os compromissos são o fim da linha das negociações, onde se trocam umas coisas por outras, onde se ganha e se perde, em nome dos interesses maiores dos dignitários do regime político que comanda a Nação.

Lembremos então por dever de consciência nas considerações gerais seguintes o enquadramento de crise económica, financeira e social em que Portugal se encontra envolto nesta circunstância em que vai decorrer a tal dita incontornável negociação do Orçamento para 2011:

1. Os últimos anos têm vindo a permitir definir com muito maior clareza e exactidão os níveis e a natureza estrutural da crise económica e financeira portuguesa. Se algumas dúvidas ainda persistissem sobre a profundidade dessa crise, a discussão que emergiu em volta do conteúdo do PEC 2010-2013 que o Governo veio a ter que apresentar à União Europeia desvaneceram-nas totalmente.

2. Nos próximos anos, Portugal estará confrontado com um conjunto amplo de medidas muito duras e abrangentes de carácter orçamental. Todavia, esse enorme esforço de redução do défice orçamental e das despesas públicas, bem como das várias iniciativas de privatização empresarial, anunciam, mesmo assim, e em simultâneo, um crescimento económico muito fraco e muito provavelmente em nova rota de desvio relativamente à média da União Europeia.

3. No final de 2013, anuncia-se como previsão um PIB que será praticamente idêntico ao de 2008, que já de si foi muito pouco superior ao do início da primeira década do século XXI. Assim, estará o País durante mais de uma década com um nível de crescimento económico francamente insuficiente e que o afasta da convergência com a média da União Europeia e da Zona Euro.

4. Subsistem também hoje aos mais diversos níveis de intervenção política e pública deficiências perceptíveis sobre a organização e dimensão estrutural e funcional do Estado, que possibilitariam, se devidamente enfrentadas, a correcção permanente do nível da despesa pública.

5. Ao mesmo tempo, constata-se a quase ausência, senão mesmo um enorme vazio, em torno da definição clara e estruturada de uma verdadeira estratégia de crescimento da economia, que incluísse nomeadamente as grandes opções de criação de riqueza e da transformação do tradicional paradigma de desenvolvimento que vem sendo reiteradamente assumido como estando em completo esgotamento.

6. Há também, por outro lado, e lamentavelmente, uma perceptível falta de pensamento estratégico em Portugal, patente aos mais diversos níveis governamentais e institucionais, pensamento que deveria traduzir-se numa afirmação consistente dos caminhos e modelos organizativos da economia e da sociedade portuguesa para a consequente inserção do País nas modernas dinâmicas internacionais da globalização competitiva que atinge violentamente a Europa e o Mundo.

7. Não é também infelizmente comparável o nível de sofisticação das nossas políticas públicas com as que facilmente se reconhecem em outros países mais desenvolvidos da Europa e da América, onde existem organizações académicas e científicas ou da sociedade civil que estruturam essas mesmas políticas de uma forma aprofundada e eficaz. A educação, a saúde ou a justiça são áreas governamentais exemplares dessas incapacidades nacionais de conceber e protagonizar tais políticas públicas.

8. As Universidades são o grande centro produtor de conhecimento científico e de investigação do mundo moderno, têm um papel insubstituível na formação dos quadros qualificados das diferentes sociedades nacionais, e foram uma vez mais inseridas como uma das prioridades da nova estratégia da Europa (até 2020), agora em início de discussão na União Europeia, estratégia que visa continuar e melhorar os resultados da anterior “Agenda de Lisboa” e dar à Europa um novo impulso de afirmação competitiva à escala mundial. Mas em Portugal as Universidades não estão profundamente envolvidas na preparação das soluções capazes de afrontar e solucionar as situações mais dilemáticas da sociedade portuguesa.

9. Não custa reconhecer, portanto, que a Universidade Portuguesa poderia vir desde já a ter um papel de ímpar relevância na promoção de soluções portuguesas para todo um conjunto de problemas de desenvolvimento e crescimento económico de Portugal nesta segunda década do século XXI. Ademais é certo que não existem dúvidas de que as Universidades dispõem das capacidades humanas e organizacionais que lhe poderiam permitir envolver-se diferenciada e vantajosamente na procura de boas e efectivas soluções para algumas das mais determinantes questões do desenvolvimento económico e social de Portugal durante os próximos anos desta década.

10. São temas determinantes para a evolução da vida económica e social de Portugal ao longo dos próximos anos, para os quais as Universidades estariam especialmente vocacionadas e habilitadas, os seguintes:

Reorganização/Reinvenção e Gestão Estratégica do Estado;
Agenda Nacional para o Crescimento Económico;
Competitividade de Portugal na Europa e no Mundo Globalizado;
A Universidade Portuguesa na Economia do Futuro.

Face à magnitude dos problemas enunciados que condicionam a qualidade e dignidade de vida dos portugueses na próxima década, como se poderá então entender que exista na própria Presidência da República esta noção simplista e mistificadora de que o Orçamento de Estado para 2011 pode apenas resultar de uma negociação inter-partidária minimalista que origine um qualquer denominado superior compromisso de estabilidade política e governativa?

E que tal negócio orçamental mínimo possa ser então superiormente considerado pelos nossos mais responsáveis órgãos da soberania republicana como o tal voluntarioso exercício estabilizador para um Portugal em que a situação de gravíssima crise económica, financeira e social é insofismável (pese embora o manobrismo ilusionista e propagandístico do actual Primeiro-Ministro e de vários dos seus Ministros)?

Nota de Interpretação: “Cada vez é menos possível uma sã política sem larga antecipação histórica, sem profecia” (Ortega Y Gasset, “Meditación de Europa”, Revista de Occidente, 1966, pág. 49).

José Pinto Correia, Economista

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Os Doutores do Governo no Futebol

(O texto que segue foi publicado originalmente no BLOG da Colectividade Desportiva, sob o mesmo título com que agora aqui se republica).

O acórdão da Adop, assinado pelo Professor Doutor Luís Sardinha, hoje finalmente conhecido e que condena o seleccionador nacional a uma pena atenuada de seis meses de suspensão é uma obra magnífica e um monumento clarificador do chamado poder de Estado. Ali se defendem desde a pureza virginal da mãe do Presidente da Adop, até aos indefesos e aristocráticos caracteres dos digníssimos membros das brigadas anti-dopagem. Para o IDP e o Governo que elabora tal acórdão e decisão nada pode tocar ou melindrar tanto a santa mãe de Sua excelência o Doutor Luís Horta como também a santíssima paz de espírito e sossego transcendental dos senhores médicos que colhem os líquidos e avaliam escrupulosamente os devidos parâmetros.

Mal, muitíssimo mal mesmo andou aquele indigno treinador, qual membro loquaz de uma ralé reles e desbocada, que usou impropérios e outras manobras vis, muitíssimo impróprias do santuário que é não apenas o futebol profissional português como o templo sacrossanto e as redomas de cristal em que vivem as brigadas doutorais da Autoridade e que dão lustro aos seus também muitíssimo dignos e puritanos dirigentes, o Presidente do IDP e o Secretário de Estado deste “nosso mui luminoso e celestial Governo”.

Tem Sua Senhoria Doutoral, o Professor Luís Sardinha, um especialíssimo cuidado em preservar o bom nome e a dignidade intocável dos homens (não se sabe se também há mulheres na Adop), alegando e ajuizando contra qualquer palavra mal dita sobre eles e seus mais estimados familiares, ou mesmo contra qualquer incidência que possa minimamente perturbar o seu protocoladíssimo trabalho e tarefas. E para tal julgam o IDP, através da Adop, e directamente também o Governo e o Senhor Secretário de Estado do Desporto que tutela o Instituto e a Adop, o seleccionador nacional de futebol a uma pena diferente e seis vezes superior aquela que a justiça desportiva autónoma tinha estabelecido.

E ainda se permite o Doutor Luís Sardinha, insigne catedrático de exercício e saúde de uma instituição de ensino universitário pública, a voluntariosa liberdade de fazer comentários desabonatórios sobre o acórdão proferido pelo órgão jurisdicional eleito da própria Federação Portuguesa de Futebol.

O IDP, e Professor Luís Sardinha, vem agora julgar em causa própria de um organismo que dele faz parte, a Adop, e o Governo vem também directamente e ainda mais inusitadamente sobrepor a sua “justiça” à da autónoma FPF.

Para além de toda a cândida argumentação e do virtuoso registo de puritanismo do acórdão do IDP, que certamente deve ser nos seus átrios e corredores um templo sacratíssimo de pureza e rectidão, o Governo vem interferir decisivamente na autonomia jurisdicional da FPF e do desporto, ao sobrepor uma sua avaliação jurídica aquela que tinha sido independentemente fixada pela justiça desportiva.

O Tribunal Arbitral do Desporto em Lausanne e a FIFA, por seu intermédio e talvez não apenas (o que se verá lá mais adiante), certamente terão subsequentemente a palavra sobre esta imparidade portuguesa, tanto mais que a fundamentação em casos antecedentes por jurisprudência no próprio acórdão do IDP é inexistente (como consta em discurso directo dos próprios termos da deliberação proferida).

Claro também é que toda esta trama político-jurídica da esfera governamental, aliada à habitualíssima incapacidade, incompetência, indecisão, e o apego aos lugares de praticamente toda esta Direcção da FPF, que lembremos vive no limbo jurídico por desconformidade estatutária há muitos meses, dá a este “Caso Queirós” um cheiro imenso a processo Kafkiano e ao Orwelliano “1984”. Lembraremos que neste último sistema político e governativo passou a imperar uma linguagem nova e asséptica, a “Novilíngua” onde inúmeras palavras antigas eram apagadas ou proscritas, e uma “Polícia do Pensamento” capaz não apenas de evitar a divergência e a dissidência tanto no pensar como na própria linguagem, como também de condenar os homens que pudessem ter um qualquer desses desvios, sobretudo quando estivessem dispostos a aceitar a sua responsabilidade individual pela desconformidade e o destempero. Portugal está pois, com esta magnífica peça acusatória do IDP e do Governo ao treinador Carlos Queirós no mundo das virgens e dos “juízes do tudo e do nada”, com um poder governamental que já nem faz questão ou cerimónia em invadir esferas autónomas e independentes do desporto para dar a cumprir a razão de Estado.

Queirós é nesta “ópera bufa” apenas um pequeno vulto destinado a expiar os pecados de lesa majestades que impropriamente cometeu.

Honra pois aos máximos virtuosos, excelsos e vigilantes Doutores da Secretaria de Estado do Desporto, do IDP, da Adop, e especialmente à virgem mãe do Doutor Luís Horta que ficará nos anais do desporto português e nos do Tribunal Arbitral do Desporto (e na FIFA, portanto).

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Que Orçamento de Estado para 2011?

Há muito quem entre nós queira entender ou persuadir os outros a entender o Orçamento de Estado como o alfa e ómega da política nacional. E são tantos os que também pensam ou levam outros a pensar que tudo começa e acaba naquele instrumento financeiro do Estado, que é isso que ele efectivamente tende estaticamente a ser.

Convém desde já lembrar que um Orçamento de Estado é em primeiro lugar apenas e só um repositório de todas as receitas e despesas do Estado devidamente orçamentadas, porque não se podem desconhecer as inúmeras tendências para realizar despesas públicas significativas fora do denominado perímetro orçamental, vide o caso flagrantíssimo da empresa Estradas de Portugal que tem já encargos previstos para 2013 e seguintes de mais de dois mil milhões de euros ou os hospitais públicos que também têm vindo a fugir desse mesmo total de despesas orçamentadas.

Deve recordar-se que quer receitas e despesas públicas constantes do Orçamento de Estado, tanto umas como as outras, são encontradas com base nas políticas definidas pelo Governo da República para a captação de recursos ou para a assunção de despesas e correspondentes realização de pagamentos.

Um Orçamento de Estado é, por isso mesmo, apenas um instrumento de gestão do Estado que concretiza as respectivas políticas públicas, que definem opções e objectivos, corporizam estruturas e missões organizacionais, todas estas decididas pela maioria governamental que detém o poder executivo. Por isso mesmo, a substância de um Orçamento de Estado, aquilo que realmente o define e pelo qual ele deve ser ajuizado, são as respectivas políticas que ele acolhe e a que financeiramente dá lugar efectivo.

As políticas públicas escolhidas pelo Governo aos seus diferentes níveis orgânicos, os correspondentes objectivos e estratégias reais, as suas metas e escolhas selectivas, os seus diferentes públicos destinatários (das famílias, às empresas, aos diversos tipos de institutos e organismos públicos), as condições de justiça e equidade que as definem, a natureza dos seus instrumentos de concretização, os seus níveis de eficácia e eficiência, o rigor da sua aplicação e dos usos dos recursos públicos, a contribuição para a melhoria das condições da economia e do emprego, do investimento público e privado produtivo e criador de valor económico e social, esses são vários dos critérios de avaliação que contribuirão para definir do grau de eficácia e oportunidade das escolhas de um Orçamento de Estado.

Sabemos e temos consciência da gravidade da crise económica e social que atinge Portugal no momento presente. Temos também, e ao mesmo tempo, consciência da fragilidade da nossa economia que praticamente não cresce há uma década, dos níveis elevadíssimos de desemprego actual e da possibilidade do seu aumento ainda no futuro próximo, das dificuldades de atracção de investimento estrangeiro de monta e significado real que a economia demonstra, das imensas dificuldades em surgirem novos projectos empresariais na indústria e sectores transaccionáveis com efectiva capacidade inovadora e de exportação, das enormes teias da burocracia e da lentidão da justiça que é inimiga das iniciativas de dimensão amigas do emprego.

Sentimos também o enorme aumento do nível de impostos directos e indirectos que o País sofreu na última década e nos meses recentes que têm servido sobretudo e apenas para continuar a aumentar imenso o peso do Estado na economia nacional, traduzido numa despesa total que já ultrapassou em 2009 metade da riqueza criada anualmente. Sabemos que o Estado tem presença fortíssima num conjunto diversificado de sectores sociais, desde a educação à saúde, e em inúmeras empresas públicas altamente endividadas e deficitárias, para além de continuar a adjudicar um conjunto vasto de novas infra-estruturas rodoviárias, escolares, de saúde ou ainda de justiça, que já excedem os recursos orçamentais disponíveis e vão constituindo dívidas acumuladas para o futuro.

Todos também temos consciência que a enorme máquina estatal que prolifera por quase todos os cantos da sociedade portuguesa não fez ao longo de todos estes dez anos do presente século um real exercício de contenção estrutural que lhe pudesse permitir gastar menos dos recursos que a economia nacional praticamente estagnada consegue proporcionar.

Por tudo isso, a despesa pública ainda agora neste ano de PEC, já com novos aumentos de impostos, aumentou mais do que o previsto absorvendo a quase totalidade desses novos recursos, a dívida pública continuará a aumentar mais até próximo dos noventa por cento do produto, o endividamento externo diário (cada vez mais difícil e caro) não pára de crescer, e o défice orçamental de 2010 será talvez já duvidosamente contido como tinha sido prometido e anunciado há meses.

Todo este panorama de insustentabilidade das nossas finanças públicas e também simultaneamente dos nossos principais sistemas sociais não é suportável pela nossa debilitada economia sem que o Estado se concentre em diminuir estratégica e acentuadamente as suas despesas, sem um verdadeiro exercício de emagrecimento estrutural com objectivos departamentais máximos devidamente fixados para a respectiva despesa, e também com metas rigorosamente definidas em todos os diferentes subsectores departamentais e da administração pública, como a educação, a saúde, as autarquias ou mesmo as regiões autónomas.

O Estado tem mesmo de congelar ou diminuir despesas em muitas das suas áreas de intervenção, com critérios claramente assumidos e defendidos pelo Governo ao seu mais alto nível. Para isso, tem de haver escolhas políticas sérias, definição clara de estratégias departamentais e de prioridades devidamente programadas e orçamentadas, dotações máximas definidas para os diferentes sectores e departamentos da orgânica ministerial, e mesmo a imposição de uma verdadeira orçamentação de base zero em muitos institutos públicos e empresas públicas deficitárias.

Em síntese, em 2011, o Orçamento de Estado deve consubstanciar uma orçamentação estrategicamente orientada, rigorosa nas despesas máximas departamentais e nos institutos e empresas públicas deficitárias e com reais escolhas e opções políticas que possam depois ser objecto de verdadeiras avaliações de resultados face ao conjunto dos objectivos previamente estabelecidos.

Este sim seria um exercício orçamental inovador capaz de contribuir de modo eficaz e consequente para afirmar uma alteração efectiva do panorama de descalabro das contas públicas em que Portugal tem vindo a viver ano após ano desde 2010, o que lhe tem exigido aumentos constantes de impostos, que já atingiram patamares excessivos, e de dívida pública crescente e praticamente insuportável de sustentar para o futuro.

Em suma, pode dizer-se sem receio de erro que não haverá, uma vez mais e em 2011, verdadeiro saneamento das finanças públicas portuguesas sem que seja travado o crescimento das despesas públicas, sem que o Estado passe por um exigente e programado exercício de redução das suas imensas despesas em muitos departamentos e sectores públicos.

Mais a mais, este verdadeiro exercício de contenção do peso real do Estado na economia nacional é tanto ou mais necessário quanto é praticamente certo e assente que em determinados tipos de despesas sociais, que introduzem mais equidade e justiça social, haverá cada vez mais pressão para que aumentem significativamente por razões, respectivamente, do envelhecimento progressivo da população, da manutenção de taxas elevadas de desemprego estrutural, da diminuição da natalidade e do aumento dos números de pensionistas e reformados públicos e privados e dos seus correspondentes níveis médios de rendimentos a que têm direito legalmente estabelecido.

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Governo Zero ou “Milesimal”

Quem quiser ter um entendimento do nível da governação actual e do que o país e os portugueses podem esperar nas suas vidas do impasse em que se vive deve fazer o seguinte conjunto de perguntas e tentar dar as respostas que a presente situação pode dar-lhes. Vamos então a algumas dessas perguntas.

Que Governo tem Portugal e qual a sua capacidade de governar? Como governa o Senhor Engenheiro Sócrates? Qual a sua estratégia, objectivos e metas e o destino que tem para o país? Como avalia os resultados das suas acções e políticas? Como enfrenta a crise do desemprego e da falta de crescimento económico? Que anúncio faz das suas opções orçamentais para 2011? O que quer dos agentes económicos empresariais privados e dos investidores estrangeiros? Como incentiva a criação de novas empresas e o aparecimento de novas iniciativas que criem empregos e actividades produtivas para mercados? O que quer fazer do Estado? Na educação, na saúde, na justiça, nas forças armadas, na política externa? Como vai reinventar a administração pública e diminuir o seu peso económico e orçamental? Para que vai servir o controle do défice orçamental e como vai ser feito? Apenas com novos aumentos de impostos ou com efectiva e racional redução das despesas? Com eventuais reduções de organismos, com fusões de entidades públicas administrativas, com reorganizações profundas das estruturas e quadros de pessoal? Com novos modelos de gestão, com planeamento estratégico, com orçamentação de base zero ou por objectivos, com orçamentos-programa? Com um verdadeiro exercício de prazo longo, dirigido ao mais alto nível governamental? Com estudos sérios envolvendo os próprios destinatários, definindo etapas e metas concretas?

Isto tudo, e as respostas sustentadas para estas questões, seria provavelmente parte integrante e fundamental de um caderno de encargos de um Governo sério que pensasse nos graves problemas nacionais e não apenas em propaganda bacoca e inverosímil que alardeia qualquer estatística por miserável que seja como um grande apanágio da sua obra.

Mas bem ao contrário disso, o Governo do Senhor Engenheiro, e ele mesmo assiduamente como cabeça falante desse Governo tanto na opinião publica como até mesmo no Parlamento, chama por qualquer décima ou mesmo milésima de um qualquer dado estatístico para dar ilusões aos portugueses de que o rectângulo é um mar de rosas. Manobra baixo o governante, com desfaçatez e despudor, tentando continuar a iludir e a negar a realidade que é tristemente difícil e com esta negação superior praticamente insuperável.

Politicamente e no que respeita à concepção de uma verdadeira estratégia que defina um caminho consequente de saída desta enorme crise de sobrevivência para Portugal, que é indiscutivelmente real, o Governo Rosa, do “Zero ou Milesimal” que trata com tanto primor as décimas e as milésimas mesmo, nada tem já para nos apresentar. O Governo do Engenheiro “destemido e omnipresente” apenas sobrevive ligado a uma máquina de ventilação que infelizmente vai empurrar o país para uma maior proximidade do abismo. E esta modorra política e de regime é fruto de um sistema de forças políticas partidárias que se anulam à esquerda e à direita e de um Presidente da República em exercício que tacticamente optou por ser reeleito em vez de promover uma atempada e indispensável clarificação, tanto do sistema político quanto, porventura, até do degradado regime.
Portugal vai, deste modo, apodrecer durante mais seis a sete meses, até meio de 2011 pelo menos, sem um Governo com vontade e estratégia política para enfrentar categoricamente a crise gravíssima e sem que se formem as coligações de forças políticas e partidárias que tenham essa vontade e estratégia. E também para que pudessem enfrentar ou mesmo por em causa muitos dos bloqueios de regime que vêm fazendo com que o país não tenha capacidade de promover o crescimento económico criador de riqueza e os empregos que possam dar esperança às centenas de milhares de desempregados e de jovens que vão chegar ao mercado de emprego.

Sem um novo Governo, sem outra vontade e estratégia política, sem reformas de muitos dos sistemas que constituem o Estado omnipotente e omnipresente, sem novos protagonistas e ideias políticas sérias e que mudem os alicerces do regime que já se condenou a si-mesmo, Portugal e os portugueses não podem ter fundamentadas esperanças de que o seu futuro e o dos seus filhos e netos será melhor e mais digno do que este presente decadente em que o país se vem tão profundamente afundando.

Nota de Interpretação: “Compreende-se que a centralização governamental adquire uma força imensa quando se associa à centralização administrativa. Por este processo, ela habitua os homens a abdicarem da vontade por completo e continuadamente, a obedecerem, não uma vez e sobre um ponto determinado, mas para sempre e em todos os pontos. Não somente os domina pela força mas paralisa-os pelo hábito; isola-os e agarra-os em seguida um a um, no meio de massa comum” (em Alexis de Tocqueville, “A Democracia na América”, Livro I, 1835).

José Pinto Correia, Economista