As Federações de Futebol de Espanha e Portugal comprometeram-se há dias com a apresentação de uma candidatura conjunta para a realização do Campeonato do Mundo de Futebol em 2018 (ou mesmo em 2022, como alternativa).
Há pouca discussão e análise crítica em Portugal sobre esta “empreitada conjunta” e ainda que aqui não seja a oportunidade de detalhar os elementos de avaliação económica dessa candidatura, ou mesmo sobre os benefícios desportivos e da projecção internacional de Portugal eventualmente derivados daquele evento, importa desde já lançar sobre a mesa um pequeno conjunto de elementos que estão ínsitos naquela candidatura conjunta.
Quando se quer avaliar a valia efectiva para um país como Portugal de um grande evento como o Mundial de 2018 tem de se começar por discorrer sobre os “fundamentais das estratégias nacionais” inerentes aos países que no caso de Espanha e Portugal se conjugam para aquela realização desportiva.
E aqui o que se deve desde logo dizer é que a estratégia portuguesa se existe ou vai existir é e/ou será sempre dependente e está cercada pela estratégia espanhola e pelos respectivos interesses e objectivos.
Espanha tem uma estratégia dominante que terá supremacia e independente da vontade estratégica de Portugal se este a tem ou vier a ter. O evento aparecerá sempre como determinado pela vontade e pelo poder de Espanha, quer em termos financeiros, quer logísticos, quer do valor internacional comparado do desporto e do futebol dos e nos dois países.
Portugal aparecerá, por isso mesmo, sempre como um auxiliar na candidatura, um parceiro menor não determinante, com vocação e papel submetidos e determinados pelo parceiro líder e mais poderoso, e sujeito a ter de aceitar as condições negociais que lhes serão obviamente impostas por Espanha. Esta tem mais poder económico no futebol, mais valor e projecção internacional no mesmo, mais sucessos nacionais e recentes e projecção desportiva globalmente perceptível e reconhecida (vide resultados em muitas modalidades desportivas e nos Jogos Olímpicos desde Barcelona 1992 a Pequim 2008).
E a Espanha está também candidata de novo a vir a ser, na sua capital Madrid, a hospedeira dos Jogos Olímpicos de 2016; o que o Mundo, e a FIFA em particular, ficarão a saber durante o ano de 2009, ainda antes, portanto, de 2010 em que será decidido pela própria FIFA que país organizará o Mundial de 2018 (e também o de 2022).
Portugal nestas condições, e também porque apenas possui três estádios com dimensão acima de 40.000 lugares como hipotéticos palcos de jogos desse Mundial, num total necessário de 12, será sempre apenas um prestimoso é útil amparo de Espanha. As escolhas fundamentais da candidatura serão espanholas, provavelmente nem os jogos de maior dimensão que são o inaugural e a final, que exigirão estádios com 80.000 lugares, virão a ser disputáveis em território português.
E se Espanha vier a ser o país organizador dos Jogos Olímpicos de 2016, a desproporção negocial de Portugal aumentará, o que reduzirá a possibilidade de realização de número de jogos a serem disputados no país no âmbito da candidatura conjunta ao Mundial de 2018.
As condições logísticas existentes em Portugal são outra limitação forte e inultrapassável. Os estádios disponíveis para corresponderem às exigências da FIFA são apenas 3. O do Benfica e o do Sporting, em Lisboa, e o do Porto – o que nem sequer cumprirá a exigência habitual de 2 estádios por cidade. E não se venha dizer que poderá haver jogos no estádio do Algarve que apenas dispõe actualmente de 30.000 lugares.
A estas limitações acrescerá também a muito provável necessidade de realizar melhorias e adaptações nos estádios utilizáveis que terão encargos não despiciendos e que terão de ser financiadas muito provavelmente por fundos públicos. Se for assim, uma grande parte dos denominados benefícios turísticos apenas se concretizarão em duas cidades de Portugal – em Lisboa e no Porto. Ficará de fora, a não ser que seja feito um grande e adicional investimento no estádio de Loulé, o Algarve – região que poderia ser alegadamente referenciada para enaltecer os virtuosos efeitos turísticos da candidatura.
Quanto aos benefícios desportivos, sem aqui detalhar a sua análise que ficará para outra oportunidade, bastará referir que a concentração de novo de grandes recursos no futebol só poderá ser vir a ser feita num país como Portugal que tem grandes limitações nessa matéria para o desporto em geral com prejuízos manifestos (as denominadas externalidades negativas) para os outros desportos/modalidades desportivas.
E lembre-se que nesta candidatura ao Mundial de 2018 não se está a falar de 10 nem 20 milhões de euros mas de muitas vezes esses valores indiscutivelmente. Num Portugal que não chegou a gastar 10 milhões de euros com o Programa de Preparação Olímpica de Pequim.
Que se façam os estudos – que já há alguns meses nós reclamámos (vide meu BLOG pessoal e artigo no Jornal “O Primeiro de Janeiro” de 23 de Outubro de 2008) – e se verifique qual o montante de investimento (em milhões de euros) que o país terá de fazer com a candidatura a 2018, para que os portugueses e o restante desporto nacional não sejam enredados numa aventura do tipo da do EURO 2004, que agora está bem à vista e a pagamento durante muito tempo (é só ver a cidade/município de Braga como um exemplo ilustrativo e os estádios de Loulé, Leiria e Aveiro sem utilização digna).
Finalmente, olhe-se em redor do futebol e discuta-se a viabilidade económica e financeira e o terreno pantanoso em que este desporto está envolto em Portugal. E peçam-se responsabilidades e medidas efectivas aos principais responsáveis – desde logo a Federação, a Liga Profissional e o Governo (porque ao Sindicato dos Jogadores só se pode e deve pedir aquilo que está ao seu alcance).
Podem num país a Federação e a Liga Profissional de Futebol, e mesmo o próprio Governo, estar tão ausentes da realidade deste desporto em Portugal, da sua tendencial inviabilidade económica com casos de insolvência de muitos clubes de primeiro plano, dos seus escândalos sucessivos nas respectivas estruturas de governação, que não se coíbam de se apresentarem com esse mesmo padrão desportivo ao Mundo – e fazê-lo sem curarem de instaurar saúde económica e ética no futebol que querem candidatar a organizar o Mundial de 2018 (ou de 2022)?
José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto.
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