“A mentira não é o contrário da verdade. Ela é apenas uma das várias formas possíveis de iludir a realidade dando espaço aos manipuladores para imporem de seguida e sem o mínimo de pudor aquilo que antecipadamente sabiam que era necessário para enfrentar a tal realidade que esconderam” (Anónimo encartado).
O Governo tem seis meses de mandato. Lembremos as promessas magníficas aos eleitores e as que se mantiveram para o Programa de Governo. Tudo era um imenso mar de rosas e uma distribuição infindável de mel.
Estado, Estado e mais Estado, obras e mais obras, grandes, muitíssimo grandes e indispensáveis. Mais emprego, muitos novos empregos, estágios para os jovens, e apoios aos desempregados. E mais justiça social, para muitos milhares e milhares de dependentes da subsidiação benevolente do Estado socialista. E casamentos homossexuais, e outras medidas de ruptura civilizacional, tudo na grande e longa marcha para a modernidade socrática.
Claro que lá pelo meio havia os números, os da dívida pública, do défice do orçamento, do endividamento externo. E os meninos do partido a proliferarem por todos os cantos da República socialista e laica.
“O Estado somos nós” diriam os governantes, os senhores do “partido rosa”, nossos senhores e amos.
Claro que vivemos em democracia e num Estado de direito. Mesmo que a primeira se reduza à forma, perca quase totalmente o conteúdo e a projecção do poder do povo, e o segundo ande completamente arredado nos dias lúgubres da moralidade que se vivem.
O Governo na sua engenharia técnica governativa foi tentando sobreviver. Porque é mais que certo que não quis nem esboçou tentar governar o país nesta época de decadência e de empobrecimento, que aliás sempre se recusou a admitir.
O Primeiro-Ministro vive algures entre uma inauguração de uma primeira pedra e um túnel do Marão. Vende cimento por todos os poros para iludir a desgraça. Recusa-se a descer à realidade, alimenta novos números e dados e canta “o conto do vigário”.
“Portugal está bem e recomenda-se nesta Europa Unida”, diz sua Excelência. “Já se vêem uns indicadores avançados que são sinais de melhores dias e de que tudo está no bom caminho”, reafirma. Não fosse o Senhor Engenheiro um optimista e um destemido decisor político desta praça-forte. Quanto ao PEQUE está tudo em ordem, ele é ousado, credível, seguro e basta-se a si-mesmo. Tudo isto nos repete o Senhor Engenheiro.
Portanto, o que agora é indispensável é fazer obra pública: TGV, Aeroporto, Auto-Estradas, Barragens. Que as próximas gerações não vão querer ficar com o país salazarista que os nossos pais nos legaram.
Entretanto, até 2013 cresceremos mais umas décimas que distribuiremos pelos muitos milhares de dependentes do nosso grandioso e magnânimo Estado socialista. Mas que importa essa minudência quando estaremos próximos de viajar para a Europa em velocidades transcendentais, teremos mais vias para chegarmos a Bragança, a Viseu e todos os lugares pensáveis do rectângulo?
Obviamente que os portugueses reconhecerão a enormidade do esforço de engenharia governativa. Sócrates será mais, maior mesmo, do que Fontes Pereira de Melo. E há-de ficar alguma obra majestosa ligada ao nome se Sua Excelência, obviamente. Talvez a Terceira Travessia sobre o Tejo, pois sempre seria um sinal dos “novos tempos” ter o nome do maior numa ponte do nosso Rio.
Este era o alegre, o muito Alegre, poético viver de Portugal até há poucos dias. Só que na Europa e no Mundo capitalista há outras narrativas e correspondentemente outras realidades, outras prioridades, outros actores e outra força dos números. E também as malvadas bruxas das agências de notação que dão aos senhores do dinheiro indicações sobre as expectativas de pagamento dos devedores e dos necessitados de empréstimos.
E então, subitamente sem aviso prévio ao nosso Governo, Portugal acordou para um pesadelo que desdizia a quente e melodiosa engenharia governamental. A divida da República passou a ficar sob ameaça de juros galopantes. O minguado crescimento económico projectado no PEQUE passou a ser revisto para menos ainda, próximo de zero, portanto. As possibilidades de crescimento futuro passaram a ser duvidosas e mínimas. A dívida pública continuaria a crescer até mais de noventa por cento da riqueza criada num ano. O endividamento externo não se reduziria e será um dos maiores de toda a União Europeia. Os bancos portugueses estão e continuarão muito endividados e com cada vez maiores dificuldades em acederem aos créditos mais raros e que serão progressivamente mais caros. O desemprego apesar das grandes obras projectadas estará sempre próximo ou mesmo acima dos dez por cento.
Esta era uma nova narrativa contada pelas instituições internacionais e continuadamente negada pelo Governo. Ao nosso Engenheiro (secundado pelo Senhor das Finanças) interessava era dizer que Portugal não era a Grécia, que essa sim estava mal, pessimamente mesmo.
Só que o dinheiro, o muito dinheiro internacionalizado e sem Pátria, que financia as dívidas dos Estados e das empresas quer ganhar mais e mais dinheiro. E como existiam presas fáceis e rendosas vai de especular contra a dívida desses países e contra a própria moeda europeia. O que é óbvio e natural pois essa é a racionalidade do dinheiro e dos agentes que o usam nos mercados globais da dívida onde se acotovelam os mais necessitados.
Neste imbróglio mastodôntico, a Europa e a sua “Zona do Euro”, não tinham nem mecanismos de defesa nem vontade política uniforme para fazer face à dimensão dos problemas criados com a possibilidade de bancarrota da Grécia e a fragilidade enorme de outros membros da moeda única como Portugal, Espanha ou mesmo a Itália (já para nem falar da Irlanda que logo em Janeiro antecipou esta embrulhada e tomou medidas duríssimas que a credibilizaram externamente perante os credores e financiadores internacionais).
Eis que agora o nosso Engenheiro nos últimos dias foi a Bruxelas. E veio de lá com a viola e o canto desafinados do seu timbre. Agora realinhado e ainda algures na estranja diz que vai baixar o défice orçamental em mais 1.600 milhões de euros, parou o Aeroporto e o TGV até Lisboa e mais um conjunto ainda não completamente esclarecido de outras obras.
Só que Sua Excelência vai ter de arranjar todo aquele dinheirinho no seu orçamento para 2010. E é bom lembrar aqui de novo tudo o que ele tem dito e redito aos portugueses.
Ainda há uma semana dizia categórico e famoso que o investimento público era a salvação da Pátria e que o aumento de IVA não senhor, porque isso não estava no seu PEQUE. E que o PEQUE era uma obra de arte imutável onde estava tudo quanto era bom e suficiente para a nossa salvação. Que PEQUE II nem pensar…!
Agora como diria a senhora minha mãe “há que torcer o bico ao prego”. Porque é isso mesmo a “pantomima socrática” em que vivemos. Só que aos que são assim tão capazes de tanta torção da verdade a minha mãe chamava vulgarmente de “pantomineiros”.
Porque cata-ventos, completamente sem rumo e sem projecto, já todos ou quase tínhamos claramente percebido que o Governo do Engenheiro era. O homem é mesmo também, e para além de outras, um adepto da marca Nike, do “Just do it” (não da deusa Nike que esta era mesmo a Deusa da Vitória e o nosso excelso civilista vai-nos levando alegremente para a derrota…!).
As falas do nosso Sócrates são, pois, um manancial que perdurará nos anais como uma verdadeira e inultrapassável “elegia da mentira”.
Nota do Sagrado: Felizmente que vamos ter entre nós o lídimo representante de “Outra Verdade”. Aquela que é capaz de nos fazer chegar mais longe e mais alto. Que trará valores intemporais e de transcendência. Que pode regar os espíritos crentes e não-crentes com a esperança de um outro viver, da bondade dos seres, da dignidade da pessoa humana, e da justiça para com os desprezados e humildes. Portugal pode e deve escutar nesta hora difícil a mensagem de caridade e de cristianismo que sempre lhe permitiu ser uma Nação ímpar e universal. E é nestes momentos de enorme dificuldade que a esperança dos portugueses tem de ir buscar o seu fundamento num verdadeiro renascimento espiritual, fundado em valores perenes e inquebráveis. Seja pois bem-vindo o Papa Bento XVI ao nosso Portugal.
José Pinto Correia, Economista
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