quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Projecto para Londres 2012: mais do mesmo?

Aqui em seguida se publica o nosso texto editado hoje no Jornal "O Primeiro de Janeiro" com o título acima indicado.
Há algumas semanas atrás num artigo de opinião que aqui publiquei referi que um dos três exercícios essenciais para a evolução futura do nosso desporto federado era o da negociação que iria fazer-se em torno do novo “ciclo olímpico de Londres 2012”.

Desde logo, importa realçar o facto de para o próprio Comité Olímpico de Portugal (COP) o anterior contrato de preparação para os Jogos de Pequim não poder ser considerado como um projecto (vide documento recente subscrito pelo Presidente do COP sobre a avaliação de Pequim e disponível no site oficial daquele Comité).

Fica assim a perceber-se que o Comité Olímpico nunca entendeu o programa de financiamento para Pequim como um projecto que deveria, por isso, estar sujeito não apenas a rigoroso planeamento como também à assunção de objectivos, metas de progresso e consequente avaliação de resultados. Provavelmente para o COP o programa de preparação limitar-se-ia a ir financiando atempadamente – e tal seria feito por intermediação directa dos pagamentos das bolsas aos atletas inscritos, o que foi conseguido junto do Governo – os percursos competitivos dos diferentes atletas, à medida que eles fossem apresentando resultados em competições que lhes permitissem a sua inclusão no programa de apoio olímpico.

Este modelo de preparação da participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Pequim nunca poderia ter contemplado a definição de uma estratégia geral de competição onde estivessem definidos os objectivos essenciais e tendo também subjacente uma visão de melhoria do nível competitivo do nosso desporto federado. Por isso, se entende agora a imensa incomodidade que resulta para o COP, e mesmo para o actual Governo, de terem sido estabelecidos objectivos que passavam, no limite, pela obtenção de um determinado número de medalhas e pontuação olímpicas.

Essa manifesta incomodidade resulta do carácter atribuído pelos respectivos “gestores” ao programa e do entendimento que dele fazia o COP que o resumia a um conjunto de bolsas olímpicas para os diferentes atletas e que nunca o preparou e desenvolveu como um projecto sujeito a planeamento, estratégia, processos de gestão profissionalizados e fixação consequente de objectivos, metas e indicadores de progresso.

Há um tempo naquele artigo perguntávamos também se o Comité Olímpico entregaria ao Governo um Relatório de verdadeira avaliação do que foi feito, dos métodos, da escolhas, dos planos e a avaliação detalhada dos resultados, ou se voltaria a fazer um dos tradicionais relatos romanceados e auto-congratulatórios da nossa participação, agora nos Jogos de Pequim 2008.

Começa agora a conhecer-se o conteúdo do hipotético Relatório do COP sobre o ciclo de 2008, logo incomodamente desmentido pelo respectivo assessor de imprensa como sendo apenas um esboço não finalizado (mas está anunciado para muito breve a aprovação do mesmo pela Assembleia do COP). E do que foi possível conhecer-se, ainda que com as necessárias cautelas, já nos parece não subsistirem dúvidas que afinal o Governo não vai ter naquele Relatório um instrumento útil para definir uma estratégia de desenvolvimento desportivo para Londres 2012.

Por isso mesmo agora no âmbito formal do relato do programa é altamente improvável que do Relatório do COP resultem quaisquer elementos substantivos para fundamentar o novo “ciclo olímpico de 2012” como um efectivo projecto de desenvolvimento desportivo, onde esteja incluída uma visão e estratégia de desenvolvimento de médio prazo, se prevejam mecanismos e processos de planeamento e avaliação e se fixem devidamente os principais objectivos da prevista participação desportiva nacional nos “Jogos de Londres 2012”.

Nestas condições, fica por esclarecer de que modo, sob que formas e com que instrumentos, será feita a negociação de um novo programa de preparação para o “ciclo olímpico de Londres 2012” entre o Governo actualmente em funções e o COP, a manter-se como foi indicado recentemente pelos membros do Governo que tutelam o desporto o mesmo modelo que foi utilizado para Pequim 2008.

Está para se saber, por conseguinte e em termos gerais, de que modo o Governo se predisporá a entregar um envelope financeiro ao Comité Olímpico de Portugal que viabilize a nossa participação em Londres 2012.

Só o conteúdo do processo e os resultados dessa negociação, que virá certamente a ocorrer no futuro próximo, permitirão responder a um conjunto de questões relevantes para apreciar da possível natureza e implicações sistémicas no nosso desporto de competição até Londres 2012.

Daí se ficará então a saber se vai existir como subjacente a essa negociação, desta vez, um projecto devidamente articulado para a evolução do nosso desporto federado que integre os fundamentos da participação olímpica em 2012, defina os respectivos objectivos, estabeleça prioridades, inclua processos de planeamento estratégico e estabeleça os respectivos modelos de avaliação e prestação de contas (a denominada “accountability” dos anglo-saxónicos). Portanto, se por isso existirá ou passará a existir uma metodologia de planeamento e gestão estratégica do desempenho ou não. E também se serão assumidos objectivos de desenvolvimento pelas diferentes federações desportivas e negociados em razão dos mesmos os respectivos apoios, ou se tudo ficará entregue ao sabor dos acontecimentos e das capacidades dos diversos atletas como manifestamente parece ter acontecido no ciclo anterior. O que aliás permite agora ao Presidente do COP dizer que o programa anterior não era considerado como um projecto (de Pequim 2008).

Será então que vai ser negociado um novo envelope para o “ciclo olímpico de 2012” apenas com base na proposta intempestivamente apresentada pelo COP (ainda antes da realização dos Jogos de Pequim) e onde de estratégia de desenvolvimento desportivo nem se falava?

Se assim acontecer então estamos falados sobre o desenvolvimento do nível desportivo nacional e poderemos prever que tipo de resultados estaremos novamente a discutir depois de Londres 2012.

Mas será então mais uma vez com o beneplácito manifesto do Governo, agora o que está em funções em 2008. E Portugal não terá aprendido nada sobre a forma de definir uma estratégia de desenvolvimento desportivo com base no “ciclo olímpico de Londres”.

O que daria, assim, imensa razão ao comentário que vai circulando de que a nossa frágil história desportiva resulta e confirma a incapacidade e ineficácia das políticas públicas e da gestão associativa do desporto em Portugal.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

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