O “mundo do futebol” em Portugal é esquisito e muito pouco justificável para quem quer ter dele e da sua estrutura económica e negocial uma visão racional. Procuremos então vislumbrar a insensatez contraditória em que vivem os principais actores do tal “mundo do futebol” nacional.
O que há de facto em Portugal à roda do futebol profissional é uma espécie de “Santa Aliança” que não quer obviamente discutir sobre a viabilidade económico-financeira desse desporto entre nós. Esta “Santa Aliança” tem actores privilegiadíssimos e poderosos. O Governo desde logo, a Federação Portuguesa de Futebol, logo a seguir, a Liga Profissional a continuar e, no final da rede, os jornais desportivos incapazes de escreverem praticamente uma linha sobre a crise estrutural que inunda o futebol.
Continuam todos nesta sagrada “Aliança”, por isso, numa estratégia de dissimulação a falar alegremente da indústria do futebol como sendo a melhor das indústrias portuguesas, aquela que melhores resultados competitivos à escala internacional vai conseguindo, mas desinteressam-se de discorrer sobre a possibilidade da sua sustentabilidade económico-financeira, sobre a contínua irracionalidade dos fundamentos económicos em que se baseia e mesmo mais decisivamente sobre as possibilidades da sobrevivência a prazo do seu actual modelo organizativo e gestionário.
Por isso, para encontrar alguma discussão dos reais problemas económicos e financeiros do futebol temos de percorrer as páginas dos jornais generalistas e económicos e sair dos meandros de intervenção daquela “Santa Aliança”. E aí, nesses “interessados externos ao futebol”, poderemos então encontrar dados sobre os prejuízos anuais dos maiores clubes, sobre os seus enormes passivos acumulados, sobre a sua situação de falência técnica.
Sobre tais elementos caracterizadores da real situação económico-financeira do futebol português poderemos então verificar que só de passivo acumulado pelos três grandes clubes estamos a falar de 440 milhões de euros e que para repor os níveis mínimos de capital social se fala em necessidades de financiamento de 90 milhões de euros, para além dos prejuízos anuais em todos eles e que só no Benfica ultrapassarão os 20 milhões de euros em 2009.
Por conseguinte, nos fundamentais económico-financeiros, os nossos grandes clubes de futebol são insustentáveis e praticamente condenados à falência se não forem uma vez mais socorridos por capitais bancários ou similares. O que não solucionará obviamente a questão fundamental que é a da sua demonstrada insustentabilidade negocial.
O negócio do futebol tal como se encontra modelado é ruinoso. Acarreta decisões época a época desportiva que hipotecam vultuosos recursos económico-financeiros sem se traduzirem em correspondentes receitas. Assim, os custos totais da actividade são sempre superiores às respectivas receitas normais e só ocasionalmente com receitas extraordinárias de vendas de jogadores no mercado internacional poderá haver algum equilíbrio. Equilíbrio que será sempre ocasional e muito incerto, senão mesmo falível em muitas situações, bastando para tal que os mercados de jogadores se retraiam e haja dificuldades de colocar os jogadores mais valiosos em clubes estrangeiros. Para também não falar da dependência flagrante em cada exercício económico das receitas eventuais provenientes da participação nas competições da UEFA. As quais mesmo no Futebol Clube do Porto, que tendo sido substanciais, não têm eximido o clube de apresentar prejuízos anuais quase permanentemente.
Na estrutura económica que define o futebol na actualidade há, portanto, uma inadequação permanente entre os custos e as receitas da exploração, sendo os primeiros sempre potencialmente superiores ou mesmo muito superiores às segundas. O que significa que ao ter-se transformado o futebol num negócio empresarial como os demais, esse negócio não é rentável e a prazo tende para a insolvência (ainda que possa ser socorrido durante muitos anos, o que tem acontecido, por entidades bancárias externas).
E é este facto hoje inquestionável, face aos dados económicos e financeiros das várias SAD que vão sendo conhecidos, que a Santa Aliança do futebol quer evitar discutir. O que daqui a pouco tempo terá efeitos devastadores para a denominada indústria do futebol e para aqueles intérpretes privilegiados do futebol que deixarão de ter negócio para gerir ou espectáculo sobre que discorrer em parangonas habituais.
Claro que o Governo já disse que não quer ser tido nem achado para crise do futebol profissional. Mas como se sabe os Governos e os governantes respectivos passam.
Mas então quando chegar proximamente o Inverno económico-financeiro ao futebol profissional que ficarão a fazer a FPF, a Liga Profissional e os jornais desportivos?
É que a continuar tudo igualmente como nos últimos anos é certo que o futuro do futebol profissional tal como está estruturado não será nem longo nem risonho!
José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto
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