terça-feira, 27 de abril de 2010

Havemos Príncipe (na Terra da Fraternidade)!


Felizmente temos entre nós um verdadeiro e excelentíssimo “Príncipe”. Ele é um maravilhoso soberano da modernidade. Não pára, voa de uma extrema do mundo à outra, viaja e percorre, vem e vai, e apruma pedras sobre pedras. Tudo caminha em grande velocidade à sua volta.

Não há nem pode haver descanso para o nosso guerreiro valoroso que por obras inadiáveis e rendosas se esforça, e faz “mais do que prometia a gesta humana”.

O “Nosso Maior” vem das melhores linhagens da espécie, tem muito engenho, sabedoria, traça a régua e esquadro cada liça, cimenta e cola, e “genha e reengenha”, encena e reencena, novidades, notícias, anúncios.

Tudo é sempre novo em volta de “Sua Senhoria”. O que ontem era assim, hoje já foi, hoje é já outro, e amanhã será por diferente ainda mais. Tudo muda, nunca passa a mesma água por debaixo das suas novas pontes. Há um perpétuo movimento, com bichinho carpinteiro, qual obreiro em evolução permanente.

Nos pequenos intróitos, numas migalhas do seu inexcedível tempo, o “Excelso” abre a voz. E aí diz ao povo que comanda “generalissimamente” ao que vem e vai, ou ao que anda. Fala pouco agora, diz o que quer e acha que deve. Que o escutem cuidadosamente, portanto, e tudo quanto trauteia é tudo quanto basta que se saiba. No resto corre afoito para o futuro, profetizando a chegada do novo mundo. Que vai ser magnífico, estrondoso, categoricamente melhor.

Mas há também uns pequenos saltos no percurso. Que não são, obviamente, nada de mais para quem de tanto foi, é, e vai continuar capaz.

O “Grande Príncipe” fará tudo bem, outra vez, como foi ontem, pois então. Melhor era impossível, nem haveria de haver quem.

A contradita de uns poucos à volta de tamanha iluminação é só maledicência, vileza, ignomínia e infâmia. Por isso, “Ele” é o maior, o mais sábio, o intrépido velejador da nossa Nau.

O “Príncipe” do finado reino, desta República magnífica (e já centenária), é o justo dos justos, o mais verdadeiro, o doutor da ética, o insigne intérprete da moral. E também o inquestionado refundador fecundo dos costumes. E é o portador da visão intangível e inédita de um Portugal imenso (do Atlântico aos Urais, por mar, terra e ar).

Este “Novo Príncipe” é perfeito, mais mesmo do que o de outras épocas. Domina ventos e marés, contas e números, cifras e códigos, décimas e milésimas. Tudo está ao seu alcance. Riqueza, impostos, dívidas, indústrias, comércios, e tantos outros e diferentes, tudo isso é de menos para o vigor do seu afã.

O ano próximo de 2013 será apenas e só um apeadeiro transitório da obra inigualável da engenharia principesca – momentaneamente escalpelizada num credível, rigoroso, detalhadíssimo PEQUE.
Claro que em redor de “Sua Magnificência” avultam ajudantes memoráveis. Uns são Vitais, outros serão Lelos, outros serão mesmo Santos. E amparam o “Vulto” nas pequenas agruras inescapáveis das contas dos dias úteis. E nos inoportunos afrontamentos dos menores plebeus que contrariam e desdizem a “Figura”.

O país com suas terras, ares e mares, avós, pais, filhos e netos, está bem entregue. E recomendam-se as suas façanhas recentes e próximas. Há um capital de luz e oportunidades no horizonte. E na frente do caminho, como farol da empreitada, está o nosso “Príncipe”.

Portugal vai ser imenso. Descoberta sobre descoberta, empreendimento sobre empreendimento, realização sobre realização, obra sobre obra, pedra sobre pedra, “Vamos ser um imenso Portugal”, na Europa e no Mundo.

Demos vivas e aspiremos à longa vida do nosso “Artífice”, que vai ao leme da Nau. A verdade triunfa sempre…! Seja em Abril ou Maio, como disse o poeta-cantor, nesta “Terra de fraternidade, o povo é quem mais ordena”.

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 20 de abril de 2010

Abril, Abril (36 Primaveras depois)!

Portugal hoje, em Abril de 2010, não é um mar de rosas. Vive-se um clima de apodrecimento do regime com casos e sinais cada vez mais intensos e frequentes. Perderam-se mitos dos valores estruturais da democracia. A humildade, a generosidade, a dedicação à causa pública, a verdade na forma de fazer política, a sobriedade nos gastos públicos, a separação entre negócios e Estado, a dignidade dos representantes do povo, todos estes valores que estiveram como adquiridos durante uma significativa parcela do nosso percurso democrático aviltaram-se e hoje são completamente postergados e irreconhecíveis.
Agora que estamos em Abril, que vamos mais uma vez tentar relembrar os sonhos de um povo criados com uma revolução benévola e florida, vejamos com alguns poucos exemplos do que é hoje a nossa circunstância como Nação o quão prostituído está o nosso ambiente democrático.

1. Taguspark
Quando foi pensado lá pelos anos oitenta do século passado no seio da Universidade Técnica de Lisboa (era então seu Reitor uma professor inigualavelmente imbuído do espírito de serviço público), o objectivo era criar um parque de ciência e tecnologia que catapultasse a ligação entre a Universidade e as empresas interessadas em fazer investigação científica que pudesse ser utilizada em novos negócios empresariais, ou mesmo em fazer aparecer novas empresas mais evoluídas tecnológica e cientificamente. Agora, como se sabe, o Parque foi tomado de assalto por meninos do poder rosa para a seu belo prazer e desmando pagarem campanhas partidárias, comprando apoio político de um futebolista a peso de ouro. Restará saber como foi possível que a administração do Taguspark fosse completamente entregue a estes intérpretes do chamado socialismo moderno, sendo que um deles até já tinha sido Presidente da nossa RTP e o outro foi o menino brilhante do governo na PT.

2. O ministro da Economia e a Economia
É espantoso que o ministro da economia vá à televisão e sobre a evolução económica do país para os próximos anos não consiga dizer nada de mais significativo do que tentar ver nas entrelinhas do PEC que a economia portuguesa também lá está devidamente contemplada. E que ainda consiga dizer que não percebe como se formam os preços dos combustíveis em Portugal (sendo que mais de metade do preço é em regra impostos para o Estado que ele representa). Mas lá vai repetindo que a grandiosa obra económica nacional é a das energias renováveis. Sobre os restantes sectores económicos, a estratégia para criar mais empresas ou para criar condições de atracção de investimento estrangeiro, ou as linhas de acção do combate ao desemprego massivo de sectores tradicionais em perda, o Senhor Ministro disse nada, zero. Estratégia económica, portanto, no Ministério da Economia é coisa de que nem vale a pena falar.

3. O ministro das Finanças e o estado de negação
O Doutor Teixeira dos Santos apresentou em Bruxelas um documento contabilístico, uma espécie de orçamento com mais receitas e menos despesas, para tentar demonstrar como pode vir a ser feita a redução do défice orçamental enorme de 2009 até ao ano de 2013. Obteve lá da Burocracia Comunitária (e do Eurogrupo) umas palavras de acolhimento e de incentivo da máquina tutelar, mas esqueceu, obviamente, alguns reparos que lhe foram feitos. E cantou vitória aqui no cantinho como se já estivesse no fim da linha da realização do seu compromisso. Por isso, ficou escandalizado quando vieram certas vozes económicas habilitadas, que não se encantam facilmente com as engenharias portuguesas, lembrar a verdadeira situação de imparável insustentabilidade do financiamento dos défices e das contas nacionais. Claro que o bom Doutor Teixeira zurziu logo nessas almas desnaturadas como se elas fossem membros dos partidos da oposição. Mas não são infelizmente. Representam aqueles que não têm votos a ganhar em Portugal e que conseguem ver a nossa gravíssima situação não apenas hoje como ainda mais no futuro próximo. Que é de morte lenta e anunciada da nossa economia e de sarilhos enormes nas finanças nacionais e na solvabilidade do Estado. Mas o nosso Senhor dos Santos nega obviamente, está na primeira fase de um processo de choque que é comummente apelidado como o estádio da negação (mas os portugueses vão sentir nas suas vidas nos anos próximos o valor intrínseco dessa negação empenhada do Ministro, embora seja difícil confirmar que ele ainda estará na pilotagem da nau em 2013).

4. Face Oculta e quejandos
Ele há muitas faces conhecidas que têm andado ocultas. De vez em quando saltam do anonimato onde prosperam e fazem prosperar os íntimos e os amigalhaços e o povo vê as escâncaras do regime. Proliferam os favores, as consultorias de negócios, as pagas de projectos que logo avançam, as licenças camarárias que se emitem, e os financiamentos partidários que se compram com facilidades dos titulares de poderes diversos. Há obras, ideias, pareceres, favores e favorezitos, nomeações e renomeações, tudo pago por uns a muitos outros a bem da vidinha de regalo e abastança. O Zé, esse que vota de quando em vez, trabalha de dia e dorme à noite, mantêm-se em silêncio à espera da justiça, que é cega como convém, e paga cada vez mais impostos para o mealheiro gigante onde comem os filhos dos deuses maiores. A camaradagem dos ditos negócios ou está no poder, bem representada como sói ser, ou tem telefones directos para esses seus apoderados. Vive-se bem nestas andanças, e lá está algures a senhora Dona Constança, encartada também para Portugal e aquém e além-mar…

5. Peque, Peque, Peque e…Pum!
Portugal agora tem um PEQUE. De agora até 31 de Dezembro de 2013. Vamos conseguir arranjar mais de onze mil milhões de euros. As famílias, as empresas, estarão lá na linha da frente da salvação da Pátria. E darão o seu dinheirinho ao nosso Estado. O Estado em 2013 terá também vendido várias das suas empresas de sempre. E feitas as contas talvez continuemos a ter como nosso Salvador o mesmo Estado governador dos cinquenta por cento da nossa riqueza nacional. Claro que as famílias e as empresas estarão talvez mais magrinhas, mas o Estado, esse ente supremo e superlativo da nossa vida, continuará poderoso como convém à República socialista e laica. No fim do PEQUE não se sabe como estarão os nossos empregos, os nossos salários e pensões, a saúde, a educação, a economia e as empresas, mas provavelmente estaremos redimidos com um défice orçamental de menos de três por cento do Produto. Se calhar no fim do PEQUE faremos um grande e estrondoso PUM. Mas isso que interessa agora quando temos que mostrar a Bruxelas que a nossa engenharia financeira cabe dentro dos critérios apertadinhos do Pacto de Estabilidade.

6. E em 25 de Abril de 2010…!
Neste domingo de Abril serão muitos nas ruas da nossa Pátria a levantar a sua voz em coro contra a falta de decoro destes desmandos, destas vergonhas que nos aviltam as consciências e tentarão também chamar à ribalta as recordações de que tem de haver outro caminho para a nossa democracia. Uma outra trajectória que combata ferozmente estas negociatas escandalosas que pululam nos corredores e meandros do poder, que fazem às escâncaras e sem vergonha a corrupção do Estado, que vendem e revendem cargos e prebendas, que distribuem entre uns quantos amigos e apaniguados os lugares disponíveis nas empresas e nos institutos públicos e que também nomeiam e renomeiam filhos, afilhados, enteados e conhecidos para os lugares bem pagos da administração pública. Que assim protegem rapidamente e num inominável emaranhado os familiares de uns e de outros. E que gastam sem pudor os dinheiros públicos sem qualquer preocupação com a sobriedade, a parcimónia, a eficácia, o rigor e o valor que esses recursos do país exigiriam.
Não, a continuar nesta caminhada intolerável a democracia e o regime desta 3ª República terão dias muito difíceis e sombrios. E chegará rapidamente o dia em que muitos dos que compõem o povo anónimo, cansado de esperar a regeneração dos que deviam servir a Nação e a dignidade da República e da democracia, entenda que é chegada a hora de colocar termo a esta impunidade desgraçada.

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 13 de abril de 2010

Uma Estratégia para Portugal (2010-2020)


A crise portuguesa não é de hoje, ela tem vindo a acentuar-se progressivamente e agora atingiu patamares inescapáveis. Tem muito de estrutural, baseia-se numa incapacidade de produzir bens e serviços com procura internacional, em fracos níveis de poupança e de produtividade e acréscimos salariais que limitam o investimento produtivo e a competitividade externa, em aumentos assinaláveis dos níveis de consumo muito baseado em bens importados, e ainda também num vasto conjunto de investimentos fracamente reprodutivos, especialmente destinados para os sectores dos bens não transaccionáveis para os quais o Estado tem direccionado ao longo de vários anos uma grande fatia dos respectivos investimentos públicos.

Portugal vive em crise económica permanente há praticamente uma década, perde empresas e empregos aos milhares e terá em final de 2010 praticamente a mesma riqueza que tinha em 2004. Em toda esta década haverá, por conseguinte, um empobrecimento absoluto dos portugueses.

A mesma riqueza terá de fazer face a encargos maiores do Estado com os chamados sectores sociais – educação, saúde, segurança social, subsídios de desemprego e outras prestações – deixando menos rendimento disponível para as famílias e as empresas. Está criada uma antecâmara para o desenrolar potencial de uma situação gravíssima que pode arrastar facilmente grandes convulsões sociais, logo que se torne impossível garantir a sustentabilidade de muitas das actuais prestações sociais a um conjunto cada vez maior de portugueses desempregados e em situação de franca debilidade ou pobreza.

Os horizontes do país são pouco animadores, estão assim muito enegrecidos, e o Governo mostra uma quase completa incapacidade de encontrar um caminho que permita renovar a esperança no futuro que aí vem. Os portugueses vão ao contrário assistindo à prática paralisia do Governo que se mostra ausente e incapaz de definir um projecto de saída desta situação insustentável.

O Governo em funções, ainda recentemente empossado, não tem uma agenda económica para Portugal que seja capaz de definir as opções de crescimento da riqueza, apontar com a iniciativa privada para um novo conjunto de projectos de investimento criadores de emprego e produtores de bens e serviços transaccionáveis, e aproveitando as oportunidades que os mercados internacionais possam ser capazes de suscitar. Bem ao contrário, o Governo tinha submetido eleitoralmente aos portugueses uma agenda económica completamente desfocada da realidade nacional e internacional e agora não se mostra à altura de pilotar estrategicamente a saída da crise estrutural do país.

Perante este quadro de referência, que exibe claramente a quase completa incapacidade e falta de iniciativa estratégica governamental, tem de aparecer na sociedade portuguesa um movimento das suas elites económicas e académicas que possa ter a missão de pensar e repensar o país, o seu futuro a médio e longo prazo, com a perspectiva de criar muita mais riqueza, projectar e fazer novos investimentos produtivos, ser capaz de atrair novo investimento estrangeiro relevante, e de procurar encontrar os caminhos de desenvolvimento económico e social que dêem esperança às novas gerações.

Tem de se por fim a um conjunto de discussões de proximidade temporal, baseadas em receitas de cosmética rápida, ou em pretensas agendas fracturantes, que têm entretido as elites políticas e os governantes de Portugal nestes últimos anos. As quais depois desembocam repentinamente num choque de realidade que o Governo inesperadamente colocou no PEC para os anos até 2013. O mesmo Governo que assobiava alegremente para o ar prometendo mundos e fundos e investimentos enormíssimos com muito discutível produtividade económica e sentido estratégico e que nesta contradição em que agora se vê contrariadamente enredado desiste de planear e realizar o crescimento económico do País.

Por isso, Portugal com o actual Governo e na linha da sua agenda política e económica tem sido incapaz de se pensar estrategicamente. Ninguém se atreve a fazer o exercício de pensar o país no médio e longo prazo, digamos num horizonte temporal de dez anos. E assim os representantes políticos e as elites económicas, empresariais ou mesmo académicas têm-se demonstrado avessas ou mesmo incapazes de fazerem um qualquer tipo daqueles exercícios de prospectiva.

Portugal não sabe qual é o seu papel na Europa (ou até mesmo na Península Ibérica), qual vai ser o seu papel no Mundo globalizado, nem sabe ou mostra desejo e vontade de perspectivar o seu desenvolvimento social e económico no médio e longo prazo. Navega à vista, sem projecto, sem visão do futuro, hipotecando recursos escassos sem orientação global para objectivos estratégicos que tivessem sido desenhados aprofundadamente. Ninguém se preocupa com cenários de desenvolvimento de Portugal no concerto possível das restantes nações mundiais. Não existem conversas estratégicas nos corredores onde pululam os actores principais da vida nacional.

Por isso, é impossível acertar vontades, clarificar caminhos e progredir num determinado empreendimento estratégico. Desconhecem-se os factores diferenciadores, aqueles que podem fazer a diferença ou o carácter único do país no jogo global das nações. Não se conhecem os sectores relevantes em que o país pode e deve apostar para se diferenciar e ter sucesso económico e geoestratégico, a não ser o predomínio quase absoluto e aterrador das energias renováveis salvadoras. Não se discute a indústria em Portugal, os seus caminhos, opções de investimentos inovadores, os seus mercados de exportação, a sua competitividade comparada com recurso aos diferentes factores de produção. Nem se discutem agendas de renovação empresarial com os empresários deste importantíssimo sector da vida económica nacional, incontornável na criação de riqueza e emprego e na afirmação competitiva de Portugal na Europa e no Mundo globalizados.

Portugal não discute estas questões, reduz-se permanentemente ao imediato ou ao acessório, e os portugueses estarão assim condenados a um futuro que os ultrapassa e lhes cairá em cima inevitavelmente. E esse futuro, nos seus contornos fundamentais, escapará, desse modo, a quadros mentais e de acções desenhados e escolhidas por vontade e interesses próprios. Mas terá contornos sociais e financeiros gravíssimos, os quais já hoje estão aí indisfarçáveis e patentes nas contas do endividamento externo, do défice público, da dívida pública e da perda de muitas empresas e milhares de empregos.

Portugal como projecto, com esperança e ambição conhecidas e partilhadas pelos portugueses jovens e maduros não existe, está aí nesta Europa sem saber ou cuidar do seu destino nacional. Sem ter uma estratégia nacional de desenvolvimento económico e social, sem ser capaz de realizar um profundo reconhecimento das grandes linhas de evolução mundiais, sem diagnósticos e cenários de evolução autónomos.

Portugal estará entregue assim, com esta incapacidade governamental e das suas elites, nesta segunda década do milénio a repetir o mesmo nível de desempenho económico e social dos últimos dez anos, num cenário mundial mais incerto, complexo e competitivamente globalizado, onde emergem novos centros de poder excêntricos à Europa (vide China, Índia e Brasil).

Da crise permanente e estrutural profunda que hoje em 2010 o País vive virá nos próximos anos, se nada de muito significativo se alterar na condução da vida nacional, a decadência e o aprofundar do empobrecimento absoluto da vida dos portugueses. Será então praticamente certo que ao lado dos mais idosos, reduzidos nas suas condições de fim de vida contrariando as expectativas que lhes foram criadas pelo regime democrático sucessivamente alimentadas por uma narrativa providencial que vem de há três décadas (desde Abril de 1974), naufragarão também as futuras gerações de portugueses, inundadas em dívidas colossais deixadas pelas anteriores gerações.

Neste caldo de degenerescência económica, social e política, é difícil que se mantenham os equilíbrios actuais e não se degradem progressiva e inevitavelmente muitas das principais instituições do regime. Há mesmo já na actualidade exemplos flagrantes dessa deterioração, cujo caso mais paradigmático é o do sistema de justiça, mas a que também já não vão escapando o da saúde e o da educação.

Portugal tem uma perspectiva de futuro pouco brilhante, de quase certa decadência e de cada vez maior afastamento dos níveis de vida da Europa, na qual estará também numa posição tendencialmente mais periférica, perdendo poder de atracção económica e de fluxos de capital e investimentos. Por isso mesmo, a estratégia portuguesa tem de ter também uma vertente tradicional atlântica, explorando todas as potencialidades da relação com a África e as Américas, as quais possibilitarão sempre ao País uma maior afirmação geoestratégica e geopolítica e a complementaridade económica absolutamente indispensável ao reforço do papel mundial da Nação portuguesa.

A natureza estrutural da crise portuguesa provavelmente não acabará com a retoma económica mundial e europeia e a saída desta crise internacional que agora se abateu sobre praticamente todos os cantos do mundo. Os factores específicos da crise portuguesa manter-se-ão e impedirão Portugal de se reaproximar dos níveis médios de desenvolvimento económico europeu. Escamotear aqueles factores intrínsecos da crise nacional é condenar o País a mais anos de medíocre crescimento económico e ao correspondente empobrecimento relativo, com as consequentes conflitualidades e aumento das injustiças e da pobreza. E condenar também as classes médias a um inevitável empobrecimento ou mesmo desaparecimento progressivo.

Tudo isto torna inadiável a concretização de um largo e profundo exercício de pensar Portugal no Mundo neste século XXI. E também numa Europa que tem inúmeros factores de perda de poder global perante a emergência de um conjunto de novos centros de poder mundial.

Este repensar de Portugal exige pois a construção de cenários de evolução, a distinção das respectivas competências distintivas e das apostas estratégicas únicas e diferenciadoras em que o País deve investir as suas capacidades e recursos especiais. Exige também uma estratégia de afirmação da iniciativa privada nacional e estrangeira vocacionada para a produção de bens e serviços inovadores e atractivos para os mercados internacionais com que Portugal trabalhará no âmbito da sua visão e ambição geoestratégica. Portugal tem de construir o seu caminho de desenvolvimento único, centrado no que de melhor tiver para desenvolver e oferecer ao mundo global e competitivo. Tem de ter uma visão nacional, um pensamento estratégico assente na identificação clara e inequívoca das suas diferenças e capacidades distintivas e explorar esses seus atributos na cena internacional em que se terá de movimentar como país autónomo.

Mas todo este exercício de pensar e repensar de Portugal para as próximas décadas tem de passar também por uma nova concepção do papel e dimensão do Estado, o qual terá de ser forte na regulação e na orientação estratégica, mas também muito menos presente como empresário e mais amigo da iniciativa privada geradora de riqueza e de emprego. O Estado terá de ser o piloto de uma estratégia de afirmação de Portugal, deixando à iniciativa da sociedade, em todas as suas expressões, o espaço para que surjam dela os projectos e os instrumentos de realização dessa nova ambição e estratégia que corporizem um verdadeiro projecto nacional de desenvolvimento para as próximas décadas deste século XXI.

José Pinto Correia, Economista

terça-feira, 6 de abril de 2010

A Inefável Demagogia Socrática: “Os ricos que paguem…”!

Quando regressou a Portugal depois de um dos seus périplos recentes, mais especial e apropriadamente o de Moçambique onde proliferaram as voluntariosas intenções de sempre, saída do País que foi muito oportunistamente atempada para coincidir com o período de tempo de trabalhos forçados de preparação do PEC pelo abandonado Ministro Teixeira (dizer que ele tem também como apelido “dos Santos” é obviamente pecado), o “Nosso Senhor dos Aflitos”, o superior engenheiro da nossa regeneração financeira (de Caeiro, o heterónimo “Engenheiro da Almas” de Pessoa, nem a simples aba do chapéu usa como facilmente se vê nas imagens), deu uma conferência de imprensa, sem direito a contraditório como conveio, em que anunciava as suas (??) medidas da salvação da Nação até 2013.

E logo aí destacou “Sua Sapiência” a medida bem socialista de apropriar aos ricos da Pátria, caída de supetão no último mês e tal em dificuldades não previstas, não apenas os habituais 42 mas os salvíficos 45% de imposto de rendimento. Disse também o “Nosso Patrono Regenerador”, em súbita e inesperada conversão à aflição nacional, que não havia mais qualquer aumento de impostos, mas apenas e só umas mexidas nas deduções e umas justíssimas quebras nos custosos e iníquos benefícios fiscais.

O “Senhor Engenheiro” dava agora à luz da ribalta uma prova de verdadeiro socialista, sem dúvida de estreitamento da sua relação ao flanco radical da dita, porque ia resolver grande parte dos problemas em que a República tinha inesperadamente acabado de cair e que não estavam previstos nem no seu Programa Eleitoral nem no mais recente Programa de Governo, pois ia fazer com que esses inumeráveis ricos do burgo pagassem tudo aquilo que indiscutivelmente era devido ao “Grande Estado Socialista”, mandador de sempre e ditador com lei.

Sua Excelência ia agora tornar-se um fautor da mais séria e afirmativa justiça, combateria as desigualdades extremas e faria de Portugal uma Nação digna de um humanismo ímpar, de fazer inveja aos maiores desse Mundo capitalista iníquo e extremo.

No PEC, lembremo-nos de relance, só para que aqui passe de lembrete, estavam agora previstos os tais cerca de dez mil milhões de euros que repentinamente ficaram a faltar à ditosa Pátria amada do “Senhor Engenheiro” para aquela se cumprir na “Europa do Euro”.

Imagine-se então a rigorosa palavra de “Sua Excelência” à Nação, cujos destinos diz comandar de forma séria, intrépida e abençoada pelos votos, quando agora bem vistos os números (por notícia da edição de 2 de Abril do Diário Económico) todos os ricos da nossa tão rendosa Terra são em número de 3.600 famílias (correspondendo a entre 120 e 140 mil pessoas, para aí um pouco mais de um por cento de todos nós, portanto) que pagarão por esse justíssimo e indomável imposto a enorme e astronómica maquia de 30 milhões de euros por ano. Portugal estará, assim, salvo, bem a salvo de qualquer manigância dos abutres do dinheiro internacional, representativamente conhecidos nas impunes agências de rating.

Mais e melhor ainda, cada uma destas famílias com rendimentos anuais superiores à imensidão de 150 mil euros irá pagar para o prestimoso Estado a soma anual de mais 8.300 euros em sede de IRS. Isto mesmo, enquanto ao mesmo tempo os pensionistas pátrios que ganhem mais de 1.600 euros mensais pagarão, sem que sobre eles recaia o tal aumento de impostos anunciado pelo “Engenheiro Justiceiro” na conferência de imprensa, mais qualquer coisita como 100 milhões de euros por cada ano.

A notícia do referido Jornal que refere aqueles dados, citando fonte governamental do Ministério das Finanças, diz mesmo que a grandiloquente medida de fazer “pagar os ricos”, tão destacada e exaltada pela nossa afanada engenharia governamental, é a que menos renderá aos cofres do Estado de todas as medidas fiscais previstas no PEC.

Haveremos de convir que “Sua Senhoria” é de uma sagacidade invulgar; e faz umas contas e uns anúncios extraordinários. Até nos faz acreditar que para arranjar os tais dez mil milhões é muito mais merecedor das trombetas da propaganda canhestra dizer que os trinta milhões dos ricos valem muitíssimo mais do que uns míseros cem milhões que os pensionistas da classe medianamente rendosa vão entregar nas mãos do “Grande Estado”. A engenharia socialista moderna tem destas aritméticas relativas, talvez influenciada pelas doutrinações dos cientistas da educação que entendem que dois e dois até podem ser quatro mas serão outras coisas também.

De tudo isto sobram da chalaça e da propaganda e visível demagogia senhorial, conveniente para aliviar as consciências de algumas almas radicais justiceiras, algumas verdades como as seguintes:

Em mais de trinta anos de democracia o nosso cantinho só conseguiu criar 3.600 famílias com rendimentos declarados superiores a 150 mil euros anuais (temos um capitalismo quase sem ricos, mas com muitas empresas de regime bem enriquecidas);

Os ricos portugueses vão pagar a mais de imposto qualquer coisa como aquilo que poderá ser entre um meio ou um quarto de cada uma das revisões de preços de auto-estradas a construir nos próximos anos (anunciadas há uns tempos nos jornais);

Trinta gestores nomeados pelo Governo para várias empresas, usando o exemplo da época do administrador valioso da PT, poderiam economizar, se deixassem de receber o respectivo bónus milionário anual, o mesmo que pagarão para a salvação do Estado socialista todos os grandes e ricos da Pátria (ou até 7 salários anuais de Presidente da EDP já chegariam para tal efeito).

Uma coisita no final deste “Rosário de 2010” parece óbvia e claríssima, o “Governo do Senhor Engenheiro”, com as suas capacidades e vontade inexcedíveis, com a sua enorme e inquebrantável determinação, não tem a poção mágica de fazer nascer em cada esquina como cogumelos os tais ricos da Nação, porque se para tal empreendimento tivesse suficiente engenho ainda ia fazer nascer “a tal ditosa Pátria Sua amada” de que muito recentemente se afirmou ser dilecto.

Nota de Causa Maior: É esta mesma “engenharia socialista” que tem preenchido a administração pública nos gabinetes ministeriais de muitos e muitos assessores, jovens na sua esmagadora maioria, entre os vinte e tais e os trinta e picos anos de vida, saídos em inúmeros casos da respectiva juventude partidária, e que começam a ganhar nas suas valiosas funções de Estado tanto ou mais do que ganham os assessores no topo de carreira que fizeram vários concursos públicos de promoção ao longo de praticamente trinta anos de funções públicas. E se se for verificar os apelidos desses meninos e meninas constata-se que eles coincidem em muitos casos com os de ministros, deputados, membros seniores do mesmo partido, ou são aparentados e amigos de outros senhores do bem-aventurado socialismo republicano e laico. Mas também se pode verificar que no Orçamento de Estado para 2010 as despesas correntes dos gabinetes ministeriais não sofrem danos com cortes ou congelamentos de verbas. Esses esforços são para os outros, os “filhos de deuses menores” que há anos vão estando ao serviço da mesma administração pública, porque aos mandantes que tomaram conta do Estado e da República só se pode, felizmente e ao luar, dar e dar a beber alegremente do “leitinho derramado dos impostos”. Até porque só assim “esses abençoados da governação” poderão fazer-se à vida, bem vestidos (de Armani, de preferência, ou de aparentados), e melhor transportados por terra e ar, seja em carrinhos alemães ou franceses dos mais luzentes, seja nos aviõezinhos especiais para as visitas de negócios da Pátria amada.
Este é o lamaçal da República, socialista e laica, em que somos obrigados a viver. Que está longe, muito longe mesmo, do que nos fez a muitos exultar em 25 de Abril de 1974 nas ruas de Lisboa de manhã até ao fim da noite, gritando e batendo no chaimite que levava para o exílio o dono do regime ditatorial que abominávamos. Agora o que temos nesta 3ª República é, como dizia há mais de cem anos Manuel Laranjeira (citado recentemente por Vasco Graça Moura), “Uma organização mentirosa, sem estabilidade, sem unidade, uma ficção de engrenagem civilizada, encobrindo a torpeza de um parasitismo desenfreado e impudente”. E acrescente-se com propriedade, um arregimentado apodrecimento onde impera muita mentira e uma enorme falta de credibilidade no topo da governação, e também uma vil e indisfarçável ganância do poder, sem visão e sem projecto para Portugal.

José Pinto Correia, Economista