As obras públicas ou os grandes investimentos em Portugal têm uma economia própria que obedece aos critérios decisionais e interesses dos políticos governantes e/ou dos financiadores bancários que intermediarão o acesso respectivo aos meios e instrumentos de financiamento, sempre com as devidas garantias assumidas pelo Estado português enquanto interessado na realização dessas obras e empreendimentos.
Assim, tem acontecido que nestes investimentos as respectivas taxas de rentabilidade dos capitais investidos e os respectivos acréscimos de valor líquido para o país não obedecem a padrões mínimos que o uso dos capitais exigiriam, tendam mesmo a ser desvalorizados em muitos casos conhecidos, quando não mesmo desprezados, em troca da alusão a conjuntos de pretensos benefícios de diversas naturezas, entre os quais se proclamam exaustivamente os da coesão nacional e os da justiça social e inter-geracional.
Quando desde há anos, longa e repetidamente, vamos falando sobre as derrapagens das obras públicas (das privadas não rezo aqui porque essas são habitualmente pagas privadamente pelos respectivos accionistas e/ou clientes), que começam ainda nas terraplanagens e até mesmo mais remotamente nos próprios esquiços arquitectónicos, tendemos a não chamar em abono da explicação racional – isto é da “ratio” que substancia esses desvios financeiros vultuosos – uma escola do pensamento económico, já devidamente nobilitada pela sueca academia, que define os parâmetros decisionais dos agentes da chamada “escolha pública” (“public choice”, em original).
Ora, as escolhas e acções dos agentes públicos, normalmente os políticos governantes, que definem, autorizam e pagam as obras públicas (em nome do nosso “Super-Estado”), e que carecem, aos mais altos níveis, de ser reeleitos de acordo com os calendários dos respectivos ciclos eleitorais democraticamente estabelecidos, obedece fundamentalmente à sua interessada “alma mater” que é a garantia (ou tentativa denodada) da sua reeleição atempada. Por isso as defendem e querem sempre de forma tão empenhada e ao mesmo tempo tão económica e financeiramente despreocupada.
Assim, entre nós portugueses, vindos de um regime ditatorial de quase cinco décadas em que ninguém contestava o Estado e as suas autoridades e decisões, para um regime desbragado de Estado magnânimo e “socialisticamente” definido e dirigido – os fracassos do liberalismo em Portugal são de todo o século XX (vide as historicamente documentadas crónicas e textos de Vasco Pulido Valente) – as responsabilidades desse mesmo Estado esplendoroso e dos seus agentes ficaram sempre “na gaveta da história”.
Não é pois possível ainda hoje, já neste novo Milénio, apresentar orçamentos para cumprir, vigiá-los e atribuir quaisquer responsabilidades que contem – é ver sobre isso, muito recentemente, as longuíssimas textuais “lágrimas” derramadas pelo Presidente do Tribunal de Contas do nosso “Cantinho” sobre um nomeado conjunto dessas obras públicas recentes. E quanto maiores são as obras maiores são os milhões de euros de derrapagens, ainda recentemente realimentadas na legislação revista de 2007, depois de grandes debates retóricos no burgo, e que permitiu para futuro tanto maior percentual de desvio na execução quanto maior fosse o orçamento de adjudicação de cada pública obra.
Claro está que os nossos queridos Ministros das Públicas Obras e das Finanças (este para aqui melhor apelidado de “Ministro dos Impostos”) estarão sempre do lado das despesas e encargos para futuro, sejam elas e eles quanto forem, e por isso contestaram de imediato as ditas “opiniões do Tribunal de Contas”. Não lhes importa que estas sejam baseadas em dados e números dos trabalhos efectivamente realizados quando comparados com os valores das adjudicações, há para “Suas Excelências” que vir logo em cima da hora a terreiro defender as obras – e com isso também os inquilinos moradores de época no Terreiro do Paço, obviamente.
Entretanto, sempre será possível ver de novo em algum dos dias seguintes o “Senhor Ministro das Públicas Obras” telegenicamente satisfeito por ter seguramente mais uma inauguração para fazer, porque ela é-lhe fundamental a ele e ao seu Primeiro-Ministro para a possível reeleição aprazada recentemente para os finais de Setembro de 2009.
Os custos astronomicamente voadores, o vil metal, essa “dinheirama” que não se sabe de quem era e de onde provém, nada disso entra muito na história. Só lá algures no meio estarão os portugueses pagadores de impostos que alimentam o tal Estado grandioso e obsequioso onde está depositada cerca de metade da riqueza nacional produzida em cada ano.
Neste cenário, que é há vai para dez anos de apagada e vil tristeza, ficará o “Senhor Ministro” (se entretanto sobreviver no “Gabinete”) e ainda mais o seu “Primeiro”, nobilitados por concluírem tão grandes projectos para o devir da populaça. Tudo em nome da modernização de Portugal, como mandam os cânones desde 1986, pelo menos, data em que nos incluímos na grande Europa das pátrias.
Um verdadeiro manancial praticamente inesgotável e ilimitado de “economia subterrânea” (como se nomeia nos livros esta parte da economia que passa fora das contas habituais que nós fazemos em casa). Uma longa e excelentíssima lista de projectos pagos principescamente pelos tais portugueses anónimos pagadores de impostos e também votantes/eleitores dos magníficos decisores políticos governamentais.
Acontece também que os milhões assim tão alegremente dispendidos estarão em bolsos grandes, tão eloquentemente engrandecidos, das muitíssimo rentáveis empresas de construção que assim medram, medram, medram até não caberem cá no “Jardim” e arejarem por essas Europas, Américas e Áfricas.
Será que algum dia se poderá vir a terminar em Portugal com estes verdadeiros “tesourinhos deprimentes”?
A mim, pelo que vou lendo, vendo e ouvindo, pelas leis que vão sendo dadas à estampa, parece-me que os interesses estabelecidos, aqueles que decidem e dirimem estas contendas, estão envolvidos de tanta maneira e vontade neles que, como sabiamente diz a “teoria económica da escolha pública”, estabelecerão o denominado “interesse público” do modo como a legislação revista em 2007 tão eloquentemente acautelou. Isto é, muitas e muitas obras, grandes facturas, enormes derrapagens como por cá generosamente se vai dizendo.
Aos pagadores de impostos destas e das próximas gerações – porque estas últimas sem o seu acordo e consciência já estão submergidas nas taxas a liquidar por muitos e bons ou maus anos vindouros – só lhes restará pagar as contas que lhes forem sendo apresentadas.
E, entretanto, aquilo que está já no horizonte para depois de Setembro de 2009 com as anunciadas obras faraónicas do futuro – os TGV, o Aeroporto, as novas auto-estradas, e outras de idêntica natureza – fazem tremer quem trabalha em Portugal, quer cá viver e criar os seus filhos. Porque os impostos, sabemos bem, são as únicas receitas certas do Estado e o modo habitual de pagar as respectivas despesas e encargos assumidos para os muitos anos que hão-de vir.
Restará sempre, obviamente, o sentimento de profunda “revolta” decorrente da respectiva contínua indignação de quem vai pagar as facturas anos após ano, ou em Setembro próximo dizer não nas urnas a estas novíssimas obras e encargos. E querer em simultâneo, com cada voto que é uma arma só nossa, um país que seja capaz de criar mais riqueza, poupando mais e investindo em projectos empresariais que sejam inovadores, empreguem portugueses qualificados e exportem bens e serviços evoluídos para o tal Mundo que está aqui bem perto de Portugal.
José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto
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