sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

O estranho mundo da FPF e do futebol em Portugal

A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) é um verdadeiro caso de estudo sobre a realidade institucional portuguesa que nos invade de lés a lés ou de fio a pavio.

Na semana passada estava anunciada a discussão sobre a alteração dos regulamentos que organizariam os campeonatos secundários de futebol, com importantes modificações nas II e III divisões.

Desde logo, quem quisesse conhecer a fundamentação económica, organizativa, territorial, logística e outras das modificações que iriam ser propostas pela FPF à sua Assembleia Geral não era capaz de encontrar no site oficial da dita FPF um único documento, uma página que fosse, com as fundamentações de tal modificação tão abrangente.

Provavelmente, na esteira do (re)conhecido funcionamento desta longa “era Madaíl da FPF”, as propostas que iriam estar em discussão nem uma folha de Excel teriam sobre os respectivos efeitos/impactos económicos e financeiros naqueles níveis do futebol nacional. Se o tivessem, ou se o tinham, o mínimo que uma instituição federada com utilidade pública reconhecida pelo Estado deveria fazer, o que se lhe exigiria, era que disponibilizasse essa análise, melhor toda a fundamentação racional das propostas que ia submeter para aprovação.

Assim devia acontecer em nome da transparência, do rigor e da responsabilização da FPF perante toda a sociedade e os cidadãos desportistas e adeptos nacionais do futebol. Porque o futebol, o desporto, não é propriedade da FPF, faz parte da cultura, da economia e da sociedade no seu todo, o que implica que os cidadãos e a comunidade devam ter conhecimento adequado e atempado sobre a sua evolução, mudanças e nova organização.

Pois que estas mudanças abrangentes para o nosso futebol das divisões secundárias, a verificarem-se, têm incidências em todas as comunidades locais nacionais onde o futebol se organiza competitivamente e nas respectivas comunidades que com ele se entrosam e o apoiam, quer como público afecto quer como eventuais patrocinadores/financiadores e voluntários dirigentes e outros.

Mas não aconteceu assim, nunca acontece assim na FPF nesta era Madaíl. Esta é a mesma FPF que se apresta a publicar no seu site todas as notícias da candidatura conjunta ao Mundial de 2018, condenando-se a servir com subserviência a estratégia espanhola (vide nosso anterior post aqui publicado), e que estará obviamente destinada a fracassar, agora que a FIFA e o seu todo-poderoso senhor Blatter já conseguiram inúmeras candidaturas de um único país e podem com inteira liberdade exercer os seus direitos e receber as rendas do monopólio que detêm sobre o Mundial de Futebol.

Mas esta história das propostas de alteração sobre a organização dos campeonatos de futebol das II e III divisões nacionais é agora ainda mais rocambolesca, e demonstra o nível de gestão e organização da FPF, quando vêm sendo publicadas notícias em que se duvida do que veio efectivamente a ser aprovado na referida Assembleia Geral da FPF.

Não existem certezas sobre o que foi aprovado e afinal sobre como decorrerão os Campeonatos Nacionais das divisões secundárias do nosso futebol, e o que dizem as notícias sobre o modo como decorreram as discussões e aprovações na dita Assembleia Geral da FPF.

E onde anda o Presidente da FPF nesta altura? Uma vez mais desaparecido, como é habitual, provavelmente a discutir assuntos da UEFA que são mais importantes para o nosso futebol.

Está a chegar um “momento de descontinuidade sistémica” ao futebol português que dificilmente o fará sobreviver económica, social e culturalmente com uma dignidade institucional aceitável. E sobre esta decadência visível do “mundo do futebol em Portugal” não se vê qualquer reflexão profunda, discussão sobre caminhos de reafirmação do seu papel e vitalidade sociocultural e económica.

Nem a FPF nem a Liga Profissional, nem a novíssima Liga não Profissional, mexem uma palha, um dedo, escrevem uma linha, lançam questões evidentes para discussão.

A morte do futebol em Portugal, do seu estatuto e significado nacional de décadas ao longo de todo o século vinte, está aí já quase ao virar da esquina. Quem não quiser ver, e tem as mais altas responsabilidades institucionais e de governança do futebol, como é o caso da FPF, vai morrer juntamente com a sua “galinha dos ovos de ouro”. Madaíl irá para a Europa como Barroso, é óbvio.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

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