terça-feira, 22 de dezembro de 2009

2010: A Odisseia no Espaço Portugal!

O ano de 2009 está praticamente no fim. Foi mau, muito mau mesmo, tanto do ponto de vista económico como social ou mesmo político. Vem aí o novo ano de 2010, o qual inicia uma nova década deste século que sucede a uma anterior praticamente perdida e sem crescimento da riqueza nacional. Seria natural e salutar que se alimentassem novas esperanças, se formulassem outros desejos, se quisessem novas acções, projectos e resultados.

Mas o que vai transparecendo é o facto de que os portugueses já perceberam que, contrariamente a muita propaganda e foguetório que andaram no ar, a realidade económica e social que aí está não se compadece nem conjuga mais com as ilusões, as maquilhagens, as manipulações e as décimas estatísticas salvíficas.

Não, os portugueses agora em 2010 vão querer mesmo é que se lhes conte a verdade da situação crítica do país, e lhes digam como vai ser possível evitar a maciça quebra das condições de vida de muitos milhares de desempregados pelos diversos cantos e sectores do seu rectângulo, como vão ser recriados no futuro os empregos para todos esses compatriotas, fazendo aparecer novas empresas e mais apostas empresariais. E também que lhes demonstrem, com realismo e projectos no terreno económico, como vai ser possível que Portugal crie outra vez riqueza que torne efectivamente possível o aparecimento de muitas e muitas novas oportunidades de prover ao sustento das suas famílias.

Claro que os portugueses querem saber, melhor exigem saber, do Governo que está em funções e que ainda agora acabou de ser devidamente empossado, e do seu Primeiro-Ministro e Ministro das Finanças em primeiro lugar, como pode ser possível diminuir o défice público dos mais de 8% para cerca de 3% em quatro anos, como vai ser possível estancar o aumento enorme da dívida pública que já vai em 80% do PIB e acorrer ao previsível aumento do pagamento dos juros anuais que já significam praticamente 3% do PIB ou 10% do valor anual das exportações, como vai ser solucionado o défice externo que supera 100% do PIB e que tem aumentado a uma cadência próxima dos 10% ao ano, como vão ser sustentados os défices enormes das empresas públicas que em várias delas já representam quase 15% do PIB, ou dos hospitais empresarializados que se situam em vários milhões de euros e das parcerias público-privado das Estradas de Portugal a pagar a partir de 2014 e que corresponderão a muitas dezenas de milhões de euros ao ano até 2030, ou ainda os custos anuais decorrentes das estradas SCUT que neste ano já suplantaram os 500 milhões de euros.

Tudo isto que é um colossal passivo para todos os portugueses serve apenas para exemplificar o conjunto enormíssimo de encargos já assumidos pelas gerações antecedentes e actuais e que vão ficar aí para que todos os que trabalham hoje e aqueles que virão a chegar ao mercado de trabalho nos próximos muitos anos encontrem meios de os solver. Estas gerações que ficarem a trabalhar e a empreender em Portugal terão durante décadas esta enormíssima “conta democrática” para pagar.

O Governo eleito recentemente e que se encontra plenamente em funções tem a estrita e democrática obrigação de começar imediatamente a dar respostas para todas aquelas questões aos portugueses, e estes têm o inalienável direito de exigirem conhecer como pensam os seus governantes solucionar esses gravíssimos problemas nacionais.
Não é aceitável e digno da ética de uma governação democrática que o país continue a assistir a um conjunto de manobras de diversão e intoxicação, alimentadas pelo partido do poder, que procuram desviar as atenções dos verdadeiros e difíceis problemas de Portugal em 2010. Ou seja, daqueles problemas e questões que podem colocar em causa o próprio futuro de Portugal se não forem eficaz e afincadamente enfrentados.

As agendas alternativas, politicamente correctas e/ou fracturantes, são nada mais do que fumo e areia para os olhos dos portugueses que não têm emprego, que não ganham aquilo que lhes permita criar os seus filhos e alimentar as suas famílias com dignidade suficiente, que têm muitas dúvidas sobre as suas condições de vida e de trabalho de amanhã, ou que caíram em situações de pobreza envergonhada a que nunca tinham estado habituados.

O Portugal de 2010 é uma verdadeira “Odisseia” para muitas centenas de milhares de portugueses desempregados que desconhecem as soluções para as suas vidas no futuro à frente dos seus olhos, e que conjuntamente com as suas respectivas famílias envolvem hoje milhões de cidadãos desta República.

O momento que Portugal vive é gravíssimo, pode ser de verdadeira e insuportável ruptura social, e exige aos governantes que se assumam como verdadeiros estadistas. Isto é, que pensem nos interesses verdadeiros do país e dos seus compatriotas, que sobreponham as soluções de médio prazo aos apetites ilegítimos e inaceitáveis da sua sobrevivência no poder, que sejam homens e mulheres capazes de apresentarem a verdade gravosa da situação que se vive e que tenham a coragem de propor os caminhos e as soluções que encaminhem o país e os portugueses para uma nova esperança. Isso sim deve ser o património de legitimação de um Primeiro-Ministro e de um Ministro das Finanças, desde logo, e em primeiro lugar – que só assim podem considerar-se a si-próprios como verdadeiros “Homens de Estado”.

Agora em 2010, perante os dados insustentáveis da economia e das finanças de Portugal, já não existem soluções doces, fáceis, ilusórias e paralelas aos dilemas e que não envolvam sacrifícios e mudança dos rumos antecedentes dos últimos mais de dez anos. Mas para as propor e pôr em prática é condição indispensável que os governantes que as corporizem perante os cidadãos tenham a dignidade e a respeitabilidade intactas. Isto é, que ninguém possa duvidar de que aquilo que agora veem defender como soluções para o país será rigorosa e estritamente praticado e que os exemplos dessas práticas começarão por vir dos níveis políticos cimeiros que propõem essas mesmas soluções.

É chegado agora o momento em que os líderes governamentais e políticos devem ser exemplares e serem os primeiros a praticarem aquilo que defendem como soluções para o futuro de Portugal. E para a consecução da necessária austeridade nacional, que deve começar no próprio Estado, os governantes devem ser os primeiros a darem exemplos de a praticarem eles mesmos e a fazerem praticar por todos quantos deles mais proximamente dependem – e desde logo nas despesas e nos rendimentos dos departamentos estaduais.

A “Odisseia de Portugal”, que deve começar em 2010, terá muitos mais anos pela frente, se for para parar a decadência e o empobrecimento que a primeira década deste século confirmou. E o próximo “Orçamento de Estado para 2010”, a apresentar no Parlamento no início do ano, é o instrumento por excelência para se confirmarem estas perspectivas e novos rumos da política portuguesa. E aí o Governo estará no primeiro dos planos para o bem ou para o mal – para o bem, se der mostras inequívocas de que quer orientar Portugal para as verdadeiras soluções dos seus dilemas críticos actuais, para o mal, se alimentar uma vez mais falsas realidades e expectativas impagáveis.

Em 2010 o país estará confrontado como uma “Odisseia no Espaço Portugal” que vai marcar o futuro económico, financeiro, social e político, bem como as condições de vida dos portugueses que trabalham e daqueles que virão a ser as próximas gerações de trabalhadores e empreendedores. E não restam dúvidas que a sustentabilidade e a dignidade de vida de todos esses portugueses depende de uma nova visão e estratégia nacional para a nova década deste século XXI, corporizada pelos governantes e as elites políticas nacionais.

José Pinto Correia, Economista

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