terça-feira, 14 de julho de 2009

Os Jogos da Lusofonia: as desculpas dos organizadores!


Nunca alimentámos grandes expectativas relativamente à pretensa grandiosidade dos Jogos da Lusofonia que era sucessivamente “vendida” pelo Presidente da ACOLOP e do Comité Olímpico de Portugal, o longevo comandante Vicente Moura. E chegámos a afirmar quando da realização da edição anterior em Macau que eles estavam ali organizados sobretudo para servirem os óbvios interesses de penetração da China em África, e mais precisamente em Angola e Moçambique.

A presente edição está decorrer em Lisboa e municípios vizinhos. Foi preparada com base num financiamento público que pode vir a aproximar-se dos cinco milhões de euros. Participam mais de mil atletas representando vários países, nos quais se incluem mesmo alguns que apenas se pode dizer que têm interesses em manterem relações próximas com Portugal e o espaço apelidado de lusófono – a dita lusofonia genericamente falando.

Quando abri a edição de hoje, dia 14 de Julho, do Jornal “A Bola” estranhei a limitada cobertura noticiosa que era dispensada aos Jogos da Lusofonia, quando comparada com as vastas reportagens que os jornalistas enviados a Macau produziram na altura daquela anterior edição (que incluíram o próprio director do Jornal). E lembro-me mesmo de então por mais de uma vez as páginas centrais daquele diário desportivo terem sido dedicadas aos Jogos da Lusofonia. Em mais de uma edição foram mesmo dedicadas várias páginas aquele evento de então em Macau. E faziam-se grandes referências à grandiosidade futura daqueles Jogos, que confirmariam a projecção intercontinental da esfera lusófona e de Portugal, como consequência manifesta.

Eis senão quando acabo de ver duas notícias da RTP online onde os principais responsáveis dos Jogos de 2009 apresentam justificações sobre a “indesculpável” ausência de público português nas provas realizadas. Vejamos então algumas dessas afirmações, começando pelo responsável máximo dos Jogos, o Presidente do Comité Olímpico de Portugal:

“Vicente Moura considera que os Jogos da Lusofonia estão ainda a construir uma imagem e daí o natural afastamento do público da competição, uma vez que estamos em época de férias, as escolas estão fechadas e as pessoas preferem a praia. O presidente do COP adiantou ainda que os Jogos da Lusofonia não se podiam realizar antes, pois, desta forma, o futebol tiraria o protagonismo a este evento. Enquanto presidente da ACOLOP (Associação dos Comités Olímpicos de Língua Oficial Portuguesa) ainda em cargo até Outubro, Vicente Moura sai com o sentimento de trabalho quase completo pois os Jogos estão garantidos por mais uma década" (sic da notícia da RTP).

Por outro lado vejamos as afirmações proferidas pelo respectivo Presidente do Comité Executivo dos Jogos:

“João Ribeiro afirmou à Antena 1 que está desiludido com o pouco apoio que os portugueses têm dado aos seus atletas. Estamos frustrados por não estarmos a ter o apoio dos portugueses (...) há mais comunidades imigrantes a apoiar as suas selecções do que portugueses a apoiar a equipa nacional. Nesse sentido deixa um apelo a quem está de férias para vir apoiar as selecções e os atletas vindos dos quatro continentes. Há vários sistemas de descontos, os bilhetes têm apenas um preço simbólico. Não fizemos tudo o que sabíamos, mas fizemos tudo o que podíamos" (sic da notícia da RTP).

Será aceitável que o representante máximo dos Jogos e do Olimpismo em Portugal, neste último caso desde há mais de uma década, venha apresentar tais desculpas para o fracasso que representa a falta de público português a assistir aos Jogos? Não seria expectável que o dirigente máximo da presente edição destes Jogos tivesse sabido encontrar as formas de mobilizar público, especialmente jovem que agora está em casa e de férias para assistir ao desporto praticado? E que essa mobilização resultasse da efectiva difusão de um verdadeiro espírito desportivo e olímpico em Portugal como prescrevem desde há muito os estatutos do COP e os princípios da Carta Olímpica que regem a sua actividade?

E se não o conseguiu como agora patenteadamente vem reconhecer é porque tal facto representa o seu grande fracasso na disseminação de uma cultura desportiva nos jovens portugueses que deveria ser um dos seus mais importantes resultados como dirigente máximo do Olimpismo português. É certo que os atributos comportamentais que resultam de uma cultura, como o seria a desportiva, não se disseminam de um dia para o outro, mas também é inequívoco que o actual presidente do COP já está à frente da instituição há mais de uma dezena de anos ininterruptamente.

Então o que fez efectivamente o COP e o Comité Executivo dos Jogos da Lusofonia para fazer chegar os jovens portugueses aos recintos desportivos onde decorrem os Jogos de 2009? E o restante público que gosta de desporto? O que foi efectivamente a estratégia de marketing e de relações públicas dos Jogos da Lusofonia? E quem agora assume realmente o evidente mau resultado? Ficaremos de novo com as já conhecidas desculpas, numa de tudo bons rapazes e de brandos costumes que irresponsabilizam os dirigentes de sempre?

Não basta agora vir dizer que estão todos de férias e na praia e que os bilhetes até têm preços meramente simbólicos. Para além dos resultados desportivos propriamente ditos dos Jogos que agora aqui não vêm ao caso mas que em si-mesmos merecem uma análise aprofundada, importa medir os impactos efectivos do dispêndio dos cinco milhões de euros no evento. Pois sabe-se que como dizem os economistas os recursos são escassos e estes cinco milhões de euros que foram dirigidos pelo Estado/Governo para a edição dos Jogos da Lusofonia deixaram de estar disponíveis para outras inúmeras realizações de apoio ao desporto, quer federado e de alto rendimento como é o caso destes Jogos, quer para o desporto escolar e comunitário (autárquico).

Vai sendo tempo de em Portugal se fazerem análises rigorosas dos níveis de eficácia e eficiência do uso dos recursos no desporto. Para não compactuar eternamente com as desculpas de dirigentes ineficazes e até também para se impedir a repetição de subsídios estatais discricionários e inapropriadamente fundamentados de milhões de euros a um piloto da Fórmula 1 só porque este iria pretensamente representar e promover a imagem do país.

José Pinto Correia, Mestre em Gestão do Desporto

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