“Portugal hoje és nevoeiro, sem missão, sem valores, sem justiça, sem moral. Amanhã tem de ser de outro modo, de muitos novos modos mesmo para revoltares ao teu destino…!”
O que é o nosso Portugal neste final de 2010, a primeira década deste novo século e milénio, com trinta e muitos anos de um dado “Regime”, que muitos caracterizam como democrático, imensamente progressista e o gerador do País dos direitos constitucionalmente conquistados/adquiridos?
Um atento observador deste “Regime”, das suas voltas e meandros, das cenas e bastidores, dos seus actores e agentes, e dos seus milhões de governados, eleitores, cidadãos quanto baste, das suas conquistas e perdições, pode ver muito, muito e muitas mesmo destas seguintes benemerências regimentais:
Os episódios e as cenas caricatas e desavergonhadas, as sucessões de trafulhices impunes, os despropósitos sucessivos e as incúrias repetitivas, as irresponsabilidades dos maiorais e os muitos irresponsáveis promovidos aos topos, as promoções indecorosas dos afilhados e correligionários partidários, as corrupções enormes de milhões e as corruptelas disseminadas intocadas, as negociatas multimilionárias de favores e obras, as múltiplas promiscuidades entre os grandes negócios e a política/políticos, as transumâncias inúmeras e vertiginosas entre ambos os lados da “coisa deles”, as juras e conjuras das várias redes ocultas de poderes e apoderados, o mando e desmando dos mandadores sem lei, a lei que nada pune e se esvanece na flagrante injustiça, a ribalta cinemática dos centos de figurões, a tragédia e a miséria de milhões, as centenas de obras de encher olho pagas a várias multiplicações de dinheiros, a deseducação computorizada dos futuros herdeiros, a desfamilarização e desorganização da vida social, a obsolescência categórica do modelo económico, o definhamento grotesco da economia, a mendicância e o tráfico dos valores, a despatrialização da Nação, a desavergonhada governação dos trutas rosados, a apagada tristeza e redução a Oráculo do Presidente e Comandante em Chefe: isto tudo e mais ainda são hoje o desnorte completo de Portugal, que assim mesmo caminha imparavelmente para o “FIM do Regime e FMI do Regime”!
Mas existem ainda vários outros factores fortes que enviam Portugal para um fortíssimo abalo sistémico e uma nova década deste milénio que ou será novamente de perdição e ditará o “FIM do Regime” ou será, ao seu invés, marcada por um prolongado ciclo de rupturas amplas com aquelas benemerências pestilentas do “Regime” que tem dado também num pronunciado apodrecimento e estrangulamento económico, social e político.
Romper com esta mendicância situacionista e com os seus actores principais para, com ímpeto e vontade e espírito de servir o futuro nacional, poder ir reconstruindo com essas mudanças profundas um renovador período de regeneração e de renascimento da Nação, essa é que deve ser a nova condição da vida política, económica, social e cultural de Portugal nesta nova década do século XXI.
Enumeremos pois então esses vários factores que a nossa vontade e alma lusíadas têm de defrontar e vencer para podermos aspirar como Nação e como Povo a um futuro mais benevolente e esperançoso:
1. Um Estado Colossal e Perdulário (O Estado Social)
Estes trinta anos assistiram a um crescimento e predominância absurdas do Estado sobre a Nação. Um Estado que é imenso, está em todo o lado, distribuiu e alimentou milhões de cidadãos, domina amplamente na economia e está em falência há muitos anos, e é despreocupada e insensivelmente gastador e perdulário. E que deixou agora uma dívida imensa que terá de ser paga pelas futuras gerações e coloca em causa o denominado Estado Social que terá de ser reconfigurado. O Estado é um dos grandes obstáculos e inimigos de criação de uma renovada Nação portuguesa. Sem uma correcção profunda deste Estado avassalador Portugal estará condenado ao empobrecimento continuado e à incapacidade de suportar uma cidadania e sociedade civil dinâmicas e geradoras de riqueza.
2. Uma Economia Fraca e Improdutiva
Nestas últimas décadas o país não foi capaz de criar uma economia produtiva competitiva internacionalmente, porque não enfrentou decidida e estrategicamente a marcha da globalização e se defendeu no seio da Europa nos sectores industriais e extractivos em que podia e devia ter apostado diferenciadamente. A economia é pouco produtiva, refugiou-se em sectores económicos isentos de concorrência e desarticulou o aparecimento de actividades criadoras de riqueza e bens consumíveis internamente e comercializáveis externamente. O nosso modelo económico está esgotado e é completamente incapaz de fazer sobreviver uma sociedade de bem-estar e com os actuais níveis de prosperidade que são iminentemente virtuais e alimentados por crédito e dívida externas.
3. Um Sistema Político Medíocre
O nosso sistema político é praticamente igual há décadas. Não se reformou, não tem os mecanismos internos de regeneração e as dinâmicas virtuosas que lhe permitam enfrentar os gravíssimos desafios que se impõem neste novo ciclo nacional. Há anos e anos que se tentam reformas parciais desse sistema político sempre sem sucesso. E as respostas que o sistema assim inerte e ineficaz tem dado ou augura vir a dar para as situações de degenerescência da vida nacional são no mínimo completamente ausentes e despreocupadas ou no máximo primam pela mais absurda inutilidade.
4. Uma Partidocracia Impreparada e Absolutista
O País construiu um sistema político completamente absorvido e dominado pelos partidos. Fora destes a sociedade não tem praticamente vida política. Os partidos do poder e do governo dominam absolutamente a máquina e os mecanismos do Estado, e em muitas situações partidarizam mesmo esse mesmo Estado em vários dos seus domínios e institutos. A sociedade civil é por isso muito frágil e incipiente, não dispõe nem de organização, nem de recursos, nem de capacidade política para se afirmar como seria exigível numa sociedade democrática adulta e de iniciativa descentralizada e de empreendimentos geradores de riqueza, bem-estar e dignidade da cidadania.
5. Um Presidente Ineficaz e Expectante
O nosso sistema político e constitucional gerou uma Presidência menorizada nos seus poderes efectivos e que se pode reduzir a ela mesma a uma figura praticamente decorativa, vulgarmente apelidada de magistratura da influência e do valor da palavra. O Presidente pode mesmo reduzir-se em grande parte do seu mandato a inaudíveis diálogos de salão com o Governo sobre os destinos do país, e de quando em vez aparecer ao Povo que o elegeu a discursar e a gerar imediatamente as assassinas interpretações dúbias e multíplices das suas palavras e mensagens. O nosso Presidente da República, e deste “Regime”, quase que se transforma mesmo no “Oráculo Supremo do Regime”, dito de “Supremo Magistrado” e a quem os portugueses elegeram por voto secreto e universal mas que como cidadãos e eleitores têm muitíssima dificuldade em perceber quais são a eficácia e a estratégia inerentes na acção presidencial e os respectivos resultados destas sobre a vida da Nação.
(A Continuar)
José Pinto Correia, Economista
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