terça-feira, 19 de abril de 2011

“O Meu Estado Social”!

Os meus sogros viveram em Moçambique grande parte da vida e ali constituíram a família e o razoável património. A minha sogra era mesmo nascida lá. Voltaram em 1975 a Portugal sem nada. Ficou tudo o que era deles em Moçambique e para trás. Para restabelecer a sua vida de trabalho cá o meu sogro teve o socorro da Caritas de Setúbal. Como era sapateiro abriu um pequeno cubículo de arranjos de calçado. E assim viveram muitos anos. Apenas com aquilo que ele ganhava com o seu trabalho que em muitos dias durava até pela noite dentro. Ele reformou-se, quando chegou a idade, e passou a receber duas reformas que totalizavam cerca de quatrocentos euros; e uma delas foi legalmente reduzida para que do conjunto delas não resultasse maior valor do que os tais quatrocentos. A minha sogra recebia um subsídio especial de retornada de duzentos euros. Mas há uns dois anos adoeceram os dois gravemente. O meu sogro com a doença de Alzheimer e a minha sogra com a de Parkinson e uma síndroma demencial. A Segurança Social deixou de pagar os tais duzentos euros; por novas condicionantes legais. Ficaram sem se poder bastar autonomamente. Procurei ajuda no Centro de Segurança Social de Setúbal. Esperei um ano e tal. Sempre com a interlocução da assistente social que reconhecera presencialmente as debilidades de ambos. Um ano passado e nada. Nova tentativa: a assistente deu-me uma lista de lares do concelho de Almada para eu ir procurar. Todos cheios, listas de espera enormes nos mais condignos. Alguns, os da Segurança Social, tinham um ar de asilos. Fiquei entregue a mim e aos meus recursos. Para lhes pagar um lar privado que arranjei fiquei sem um dos ordenados que tinha. O da minha mulher passou a ir todo direitinho para pagar as mensalidades. Foi assim que o meu Estado Social veio bater à minha porta. E continuei a ouvir o Presidente da Segurança Social na Televisão a dizer que “cada caso seria um caso, e que a Segurança Social ia lá estar”. Qual Segurança Social, pergunto eu? A de Setúbal? Essa não existe, foi apenas preencher papel e entregar os meus sogros debilitados à sorte do meu bolso. Grande Estado Social o meu! Trouxe-me de volta à classe social de onde tinha conseguido sair depois de longos anos de estudo e de trabalho como funcionário do Estado.


José Pinto Correia, Economista

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